São Paulo, segunda-feira, 28 de maio de 2007

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Cerco chavista cria elite de mídia pró-governo

SIMON ROMERO
DO "NEW YORK TIMES", EM CARACAS

Arturo Sarmiento fala um inglês aperfeiçoado em Sandhurst, a academia militar britânica. Ele fez fortuna vendendo petróleo e importando uísque. Agora Sarmiento, que tem apenas 35 anos e é defensor ferrenho do presidente Hugo Chávez, é dono de uma rede de TV em expansão na Venezuela.
Enquanto os ânimos se acirram em torno da decisão de Chávez de não renovar a licença de operação da RCTV, uma nova elite da mídia vem emergindo no país. Ela é composta de devotos ideológicos de Chávez, altos funcionários governamentais e magnatas como Arturo Sarmiento.
A situação atual marca um contraste com o estado em que a mídia se encontrava quando o governo de Chávez começou, em 1999. Na época, a imprensa era em grande medida privada, pertencente a setores empresariais ricos e hostis a Chávez. Os defensores do presidente dizem que a velha guarda da mídia trabalhou ativamente para minar as ações de Chávez.
"Com a polarização que acometeu a Venezuela, as organizações de mídia vêm sendo empregadas para provocar mudanças políticas", declarou Sarmiento em entrevista recente.
Ele diz que seus planos para a emissora privada TeleCaribe, que adquiriu no ano passado, são diferentes: oferecer uma programação adaptada aos públicos regionais do país. "Os veículos de mídia não devem envolver-se na política", disse.

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O controle da mídia sempre foi importante para os governos interessados em aumentar seu poder. Chávez vem duelando com adversários na mídia, e, ao mesmo tempo, fortalecendo os veículos leais a ele.
Por exemplo, os jornais favoráveis ao governo vêm recebendo quase 12 vezes mais publicidade governamental, disse o pesquisador Andrés Cañizáles, da Universidade Andrés Bello, citando um estudo com quatro dos maiores diários do país.
"Os governos venezuelanos anteriores também usaram a publicidade como maneira de consolidar seu apoio na mídia", disse Cañizález. "A diferença é que hoje o governo fez do aumento de suas operações de mídia e do combate a seus adversários na mídia elementos centrais de sua estratégia."
O presidente acusa a RCTV e outras emissoras privadas de ter apoiado o que equivaleu a um golpe de Estado que durou 48 horas, em 2002. No caso da RCTV, o governo diz que a rede entrou em conluio com os golpistas, fazendo um blecaute de notícias após o afastamento de Chávez e colocando desenhos animados no ar quando ele voltou ao poder, dois dias depois.
Enquanto o poder político de Chávez foi crescendo, com pessoas leais a ele controlando a Suprema Corte, a Assembléia Nacional e a maioria dos governos estaduais, a RCTV conservou uma postura crítica.
Duas outras emissoras de alcance nacional, a Televen e a Venevisión, reduziram a cobertura crítica. Os partidários de Chávez afirmam que a cobertura crítica ao governo revela sentimentos elitistas e racistas. Os dissidentes alegam que a mídia noticiosa é sua única possibilidade de exercerem seu direito à expressão, já que outros veículos são controlados por Chávez.
Enquanto isso, o governo de Chávez vem criando uma série de empreendimentos de mídia controlados pelo Estado.
Quando Chávez foi eleito pela primeira vez, o governo tinha só uma emissora de TV e duas de rádio. Hoje existem quatro novas televisões controladas pelos governos central e regionais e sete novas rádios.
Alguns dos novos empreendimentos, como o Telesur, uma rede de TV a cabo que faz jornalismo regional e tem agenda latino-americana, semelhante ao pan-arabismo da Al Jazeera, estão assumindo as operações de emissoras privadas. A Telesur, sediada em Caracas e financiada em grande medida pelo governo, adquiriu recentemente o sinal de transmissões da emissora privada CMT, permitindo que alcance um público mais amplo, não restrito ao público da TV a cabo.


Tradução de CLARA ALLAIN

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