São Paulo, sexta-feira, 28 de agosto de 2009

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Cristina propõe polêmica lei de radiodifusão

Projeto limita concessões privadas a 33% das TVs argentinas e determina que resto deve ser controlado por Estado, igrejas e sindicatos

"Liberdade de imprensa não pode ser confundida com a liberdade dos proprietários da imprensa", diz presidente ao enviar norma a Congresso


Juan Vargas/France Presse
Apoiadores da presidente argentina se manifestam a favor de nova lei em frente à sede do governo

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, enviou ontem ao Congresso um projeto de lei que "vai pôr à prova a democracia no país", segundo ela.
O projeto disciplina os Serviços de Comunicação Audiovisual e substitui "a velha lei da ditadura", como ela se refere à Lei de Radiodifusão, promulgada em 1980, durante o governo do general Jorge Videla (1976-1981), e ainda em vigor.
É objetivo declarado da presidente que o novo texto cerceie os "monopólios" de comunicação, em nome da construção "de uma Argentina mais democrática e mais plural".
A nova lei estipula que a exploração dos serviços de rádio e TV por empresas "com objetivo de lucro" seja restrita a 33% das concessões. O restante se divide entre Estado e entidades como igrejas e sindicatos.
Além do rádio e da TV aberta, o projeto regula TV a cabo, telefonia e internet. "Seria ingênuo não admitir a necessidade dessa norma dar um salto às novas tecnologias. Quando se sancionou a lei, o mais moderno que havia em telecomunicação era o fax", disse Cristina.
Se aprovado sem alterações, o projeto do governo será desfavorável aos interesses econômicos de diversas empresas atuantes no setor, como o grupo Clarín, atualmente considerado pela Presidência como um robusto adversário.

"Extorsão"
No ato de assinatura do projeto, transmitido em cadeia de rádio e TV, Cristina afirmou que "liberdade de expressão não pode se converter em liberdade de extorsão; liberdade de imprensa não pode ser confundida com a liberdade dos proprietários da imprensa".
Legisladores da oposição reagiram imediatamente. Tentarão fazer com que o projeto não seja apreciado antes de dezembro, quando o governo perde maioria no Congresso, com a posse dos representantes eleitos em junho passado.
O deputado Francisco De Narváez, rival dos Kirchner e alçado à condição de "estrela" após o pleito, classificou de "mal-intencionado" o envio do projeto neste momento.
"É uma lei que muda o curso [da vida] dos argentinos, para um lado ou para o outro. Como [os Kirchner] não podem melhorar a realidade, vão tentar ocultá-la nos meios de comunicação. Com essa lei, vão influenciar a opinião pública, desenhando uma realidade que não existe", disse De Narváez.

Concorrência
O deputado é sócio de um importante canal de TV argentino. A nova lei veta aos membros do Legislativo a propriedade de meios de comunicação.
Para De Narváez, "não é coincidência" o envio pelo governo do projeto de lei de Serviços de Comunicação Audiovisual no mesmo dia em que a Comissão Nacional de Defesa da Concorrência anunciou que obrigará a Telecom Itália a retirar seus investimentos feitos na Telecom Argentina, porque eles configuram monopólio. Ele vê nessa decisão um ataque ao empresariado.
O deputado Fernando Iglesias (Coalizão Cívica) também criticou o discurso da Casa Rosada por seu suposto viés antiempresarial. Segundo ele, a presidente "se apresenta como sendo de um governo nacional e popular que tem do lado contrário os monopólios".
O deputado citou que trabalhou "em defesa dos direitos humanos" antes de reprovar Cristina por dedicar o projeto "aos 118 jornalistas desaparecidos durante a ditadura, que, com suas vidas, deram o testemunho do verdadeiro exercício da liberdade de imprensa".
Disse Iglesias: "Estou farto de ver a presidente utilizando os desaparecidos para justificar tudo. Uma bandeira da sociedade argentina está sendo manuseada como se fosse a bandeira de um só governo".


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