São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2008

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A REVOLUÇÃO AOS 50 / UMA VOZ À ESQUERDA

"Regime tem hoje mais condição de resistir"

Para o cientista político Heinz Dieterich, lenta abertura econômica e manutenção do monopólio de poder do PC revigoram comunismo

Gradualidade das mudanças garantirá sua eficiência e a modernização, diz alemão; para ele, a situação é melhor hoje do que era nos anos 90


FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Ex-assessor do presidente venezuelano, Hugo Chávez, o cientista político alemão Heinz Dieterich vê o regime comunista cubano em melhores condições hoje para permanecer do que nos anos 90. Em entrevista à Folha, o professor da Universidade Autônoma Metropolitana (UAM), na Cidade do México, também elogia os primeiros meses de Raúl Castro no poder:

 

FOLHA - Como a revolução cubana chega aos 50 anos?
HEINZ DIETERICH
- Ao menos chega aos 50 anos. Esse já é o primeiro mérito da revolução, sobreviver a esse entorno hostil. Em segundo lugar, a situação é muito mais favorável do que os anos 90, no chamado período especial após a queda do bloco socialista europeu. E também se rompeu o cerco que George W. Bush implantou.

FOLHA - Como foram os primeiros meses de Raúl Castro no governo?
DIETERICH
- Com acertos. Houve uma modificação considerável tanto do modelo econômico quanto de política futura. No econômico, é muito óbvio, há um modelo comparável à política de Lênin ou com os primeiros passos de Deng Xiaoping, na China. Ou seja, uma abertura de mercado. Isso é uma mudança qualitativa com alterações significativas, como o arrendamento da terra. Na cultura política, vejo uma tentativa de reativar a democracia mantendo o controle do Partido Comunista, reativando a participação e ativando a economia rumo à economia de mercado.

FOLHA - Mas é uma abertura sem incluir liberdades civis.
DIETERICH
- Isso é uma característica desse modelo de modernização. Assim foi na Alemanha, no Japão, na Coréia do Sul. É um partido e um Estado que controlam o poder, não há muita democracia formal. A leitura que faz Cuba da União Soviética é a de que se tentou mudar demasiadas coisas de uma vez e se perdeu o controle. Nesse sentido, eles seguem o modelo chinês, de modernizar uma variável principal, a economia, e não todas ao mesmo tempo. Cuba liberou alguns direitos civis. Raúl disse que é absurdo que os cubanos não pudessem se hospedar em hotéis do país nem ir ao exterior. Ele liberou a compra de eletrônicos. Há abertura em certas liberdades formais, mas controlada. O que eles não cederão antes de mudar o bloqueio americano é o monopólio de poder do partido. O partido único é indiscutível.

FOLHA - O que muda com Obama?
DIETERICH
- Os imperativos de Obama são os mesmos que Bush tentou implementar. Mas Obama deve usar o poder dos EUA de uma forma muito mais inteligente na América Latina.

FOLHA - Há uma disputa entre Lula e Chávez por influência em Cuba?
DIETERICH
- Há diferentes intensidades na relação com os Estados de acordo com o que podem oferecer. Mas o governo cubano tem uma enorme maturidade política para não fomentar essas coisas. Lula, Chávez e Raúl sabem que tensão não beneficia a nenhum deles.


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