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Brasil considera situação fora de controle
Assessor de Lula afirma que Micheletti "rasga a máscara" ao fechar rádio e TV e que desfecho de crise é "imprevisível'
Governo brasileiro se vê de mãos atadas diante de escalada de golpistas, mas não pretende transformar Manuel Zelaya em asilado
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
O governo brasileiro considera a situação de Honduras fora de controle e não descarta a
invasão da Embaixada do Brasil
em Tegucigalpa e nem mesmo
uma guerra civil no país centroamericano, dividido entre o
presidente deposto, Manuel
Zelaya, e o governo golpista de
Roberto Micheletti.
"Além do boicote internacional, poderá haver um boicote
interno caso os golpistas decidam impor eleições [em 29 de
novembro] sob estado de sítio.
E boicotes não se fazem com
flores", disse à Folha o assessor
internacional da Presidência,
Marco Aurélio Garcia, sobre a
possibilidade de a situação política desandar de vez.
No Itamaraty, o chanceler
Celso Amorim passou a tarde
reunido com seus principais
assessores, tanto da área política quanto de América Latina,
sem chegar a uma conclusão
sobre o que poderia ser feito
daqui em diante para amenizar
a radicalização dos dois lados.
Sem ter o que fazer ou articular na prática, a decisão tanto
do Planalto quanto do Itamaraty é "operar em cima das circunstâncias", como ouviu a Folha de uma autoridade envolvida com a questão.
Isso significa que o Brasil está a reboque dos atos cada vez
mais beligerantes do governo
Micheletti -que não reconhece oficialmente. Em caso de invasão, só há uma coisa a fazer:
jogar o problema no colo da
ONU (Organização das Nações
Unidas), convocando o Conselho de Segurança.
Uma coisa, porém, já está decidida: o Brasil não vai ceder à
pressão do governo Micheletti
exigindo que Zelaya passe de
"hóspede" para "asilado" na
embaixada brasileira. Essa mudança significaria abrir o caminho para retirar o presidente
deposto do país, uma decisão
que cabe exclusivamente a ele
-e após 85 dias de tentativas
infrutíferas de retorno, Zelaya
dificilmente quererá deixar
Honduras após enfim ter conseguido voltar ao país.
"Há um impasse importante,
a situação já é grave, continua
se acirrando, e o desfecho é imprevisível", analisou Garcia, refletindo o sentimento de impotência tanto do Brasil quanto
da própria OEA (Organização
dos Estados Americanos) depois que Micheletti rechaçou
todas as tentativas de negociação e de acordo, expulsando inclusive uma delegação da OEA
anteontem.
Segundo ele, Micheletti demonstra "uma inabilidade
enorme, se recusa a fazer qualquer gesto de negociação e rasgou a máscara ao decretar estado de sítio e invadir uma TV e
uma rádio".
"Algumas coisas precisam ficar claras: a origem de tudo foi
um golpe de Estado, o problema se chama Micheletti, é ele
quem está aumentando a escalada, e o Brasil não se meteu
numa enrascada, e sim foi metido", disse Garcia.
Ao assumir tão apaixonadamente um dos lados, o de Zelaya, o Brasil não jogou fora a
chance de ser mediador?
"Quem tem de negociar são
eles. E não é com o Brasil e sim
com a OEA. Não se trata de uma
questão bilateral", respondeu o
assessor de Lula, criticando os
que acusam o governo de ter se
metido na questão hondurenha
na ânsia de expandir sua liderança regional da América do
Sul para a América Central e o
Caribe.
"Não buscamos protagonismo nenhum fora da zona de influência do Brasil. Podem continuar não acreditando, mas fomos absolutamente surpreendidos [com a chegada de Zelaya
à embaixada brasileira]", disse
o assessor de Lula.
Garcia insiste em que, apesar
de o presidente da Venezuela,
Hugo Chávez, principal aliado
do presidente deposto hondurenho, ter ficado sabendo antecipadamente da operação de
retorno de Zelaya ao país, não
teve a atuação tão decisiva como lhe tem sido atribuído por
parte da imprensa: "Foi uma
operação estritamente hondurenha, articulada por hondurenhos. Querem atribuir tudo
sempre ao Chávez, transformando-o no novo "ouro de
Moscou", como se [na América
Latina] só houvesse um bando
de imbecis sem ideia própria".
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