São Paulo, sexta-feira, 29 de outubro de 2004

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Ausência do palestino muda política de Israel

MICHEL GAWENDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE TEL AVIV

A ausência de Iasser Arafat no comando palestino impõe uma mudança drástica na política de Israel, coloca um ponto de interrogação sobre o futuro do plano de retirada de Gaza do primeiro-ministro Ariel Sharon e reúne, pelo menos em teoria, a esquerda e a direita do país em torno de propostas de reabertura de negociações com os palestinos.
O governo de Israel sustenta que Arafat é o obstáculo para a paz e que nunca deixou de ser um terrorista. Sharon afirma que o país foi obrigado a adotar políticas unilaterais, como a retirada de Gaza, por não ter um parceiro de negociação.
Durante meses a liderança militar e política de Israel debateu como matar ou expulsar Arafat dos territórios palestinos.
Agora, com o presidente da Autoridade Nacional Palestina fora do poder sem interferência direta israelense, as medidas unilaterais não seriam mais necessárias e as portas para as negociações voltariam a ser abertas.
O governo de Sharon e a oposição ao primeiro-ministro -tanto dentro quanto fora da sua coalizão- concordam com isso.
Com a chance de retomada de negociações, o roteiro para a paz, apoiado pela comunidade internacional, mas engavetado por Sharon, poderia voltar à agenda política e ofuscar a proposta de retirada de Gaza.
O Avodá (Partido Trabalhista), o maior da oposição, mas que aderiu à proposta do primeiro-ministro e salvou Sharon da derrota na votação do plano de Gaza nesta semana no Parlamento, passará a exigir a volta das negociações com os palestinos como preço para manter o apoio ao ex-general. E o roteiro para a paz é a opção predileta da oposição trabalhista.
O chanceler de Israel, Silvan Shalom, integrante do grupo de rebeldes do partido de Sharon, o Likud, apressou-se em sair à mídia na quinta-feira e afirmou que agora o projeto de Gaza deve ser revisto e realizado por meio de negociações, mas somente com uma eventual liderança palestina moderada. "Nada pode ser pior do que Arafat", disse Shalom à televisão de Israel.
Os partidos nacionalistas religiosos da coalizão do governo Sharon, que são contra a devolução de qualquer território aos palestinos, tratam o afastamento de Arafat como ferramenta para refutar o fim dos assentamentos de Gaza.
Eli Yishai, presidente da legenda ortodoxa Shas, pediu publicamente o congelamento da iniciativa de Gaza, também usando o argumento de que a medida não pode seguir adiante antes que Israel saiba quem assumirá o controle político entre os palestinos.
A visão do presidente do partido da coalizão de esquerda Iachad-Meretz, Yossi Beilin, co-autor do plano alternativo de paz conhecido como Iniciativa de Genebra, também é a de que israelenses e palestinos têm agora uma chance de voltar a conversar. Para ele, o afastamento de Arafat tirou o "álibi" que Sharon usava até agora para negar o debate.
Beilin tenta com isso aproveitar a brecha política e devolver o campo da esquerda ao cenário. O grupo continua isolado e sem poder eleitoral, mas agora tem mais esperança de ganhar espaço se a diplomacia voltar aos trilhos.
O debate no momento em Israel é sobre o futuro das políticas de governo diante de um substituto moderado para Arafat.
Mas, caso a saída do líder provoque conflito armado e mais caos entre os palestinos, as decisões vão escapar dos políticos e voltarão para as mãos dos generais de Israel.


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