São Paulo, terça-feira, 30 de outubro de 2007

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análise

Vitória forte, mas com uma base estreita

JULIO BURDMAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Cristina Fernández de Kirchner venceu as eleições com apoio majoritário dos eleitores, mais ou menos como Alfonsín em 1983, Menem em 1989 e 1995, e De la Rúa em 1999.
Desde a feroz crise de dezembro de 2001, a Argentina havia perdido sua qualidade de presidentes com forte legitimidade eleitoral: Rodríguez Saá e Duhalde foram governantes de transição, e Kirchner chegou ao poder com apenas 22% dos votos.
Mesmo assim, esse retorno à normalidade democrática não deixa de incluir algumas mudanças. A oposição fragmentada terá de procurar uma nova fisionomia. E o voto em Cristina teve clara motivação social. Ao contrário de Menem, que seduziu os pobres mas incorporou os setores de renda média e alta -os eleitores de direita- em sua coalizão, a base eleitoral de Cristina é exclusivamente peronista.
A força eleitoral é dado importante. Caso tivesse de enfrentar um segundo turno, Cristina sofreria um custoso desgaste. Ela oferece muitas incógnitas para um governo que enfrentará desafios inéditos: a primeira mulher eleita presidente; uma legisladora, quando todos os passados presidentes foram governadores; e mulher do atual chefe de Estado, o que gera curiosidade sobre como será o diálogo íntimo que ela vai manter com aquele que promete se consolidar como líder político do peronismo.

Hiperpresidente
Fernández precisa iniciar seu governo com recursos próprios de autoridade, a fim de enfrentar as demandas que receberá, logo de saída, de sindicalistas, empresários e governadores, que vão apresentar a fatura pelo apoio. O "pacto social" não é mais que um espelho idealizado do novo modelo corporativo de governo surgido na Argentina do pós-crise.
Para os opositores, mesmo assim, a consolidação eleitoral de Cristina Kirchner é um sinal de alarme; ela herdará não só um esquema centralizado de poder como, dizem, é uma pessoa pouco suscetível às idéias alheias. Ela se identifica ideologicamente com a social-democracia européia clássica, mas é sul-americana e industrialista, compreende que a Argentina precisa voltar a se integrar ao mundo e promete institucionalizar o modelo "hiperpresidencialista" adotado depois da crise. Ainda assim, terá de responder à sua própria base, que talvez se prove refratária a diversas das mudanças que sugere.


JULIO BURDMAN , 34, é cientista político na Universidade Belgrano e analista do instituto Nueva Mayoria


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