São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 2010

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Base militar é ilha de riqueza em Porto Príncipe

DOS ENVIADOS A PORTO PRÍNCIPE

Climatizada, jardinada e conectada 24 horas à internet sem fio, a base brasileira em Porto Príncipe é uma ilha de riqueza na depauperada realidade das Forças Armadas.
Para ser um dos 1.250 integrantes do contingente brasileiro da Minustah, a força de paz da ONU, a disputa é grande entre soldados e oficiais de todo o Brasil. O processo de seleção é exigente e envolve testes físicos e psicológicos.
Além do salário, há um adicional no valor de quase US$ 1.000 no caso de soldados e de US$ 4.500 no de um coronel.
As posições de comandante do batalhão brasileiro e, mais importante, de comandante geral das tropas da Minustah (que reúnem 17 países) estão hoje entre as mais prestigiadas na estrutura militar brasileira.
"Esta realidade aqui você não encontra em nenhum batalhão no Brasil", diz o coronel João Batista Bernardes, comandante do Brabatt (nome do batalhão brasileiro).
São 120 mil m2 (11 campos de futebol) de uma estrutura sem luxo, mas confortável. Soldados dormem em contêineres convertidos em quartos coletivos, onde foram colocados beliches. Oficiais têm uma área especial, com pequenos jardins na porta, que ganhou o apelido de Pétionville, em referência ao único bairro de Porto Príncipe que pode ser definido como de classe alta.
O "rancho" é rico e variado, para ajudar a manter elevado o moral da tropa em um ambiente adverso e longe da família.
No café da manhã, há pão, queijo, leite, frutas e cereais. No almoço e jantar, arroz, feijão, farinha, batata, carne, verduras, macarrão e sobremesa. Em nada parecido, portanto, com a penúria enfrentada por quartéis que já tiveram que operar em meio expediente por falta de comida. "Esta não é uma prioridade apenas do Exército, é uma prioridade de governo", explica Bernardes.
O governo já gastou R$ 700 milhões com a Minustah desde seu início, em 2004. A ONU banca algumas despesas, como alimentação, mas o governo brasileiro complementa o que é insuficiente, como a carne.
Em ocasiões especiais, como na troca de contingente, é oferecido um churrasco. Mas é proibido o consumo de álcool.
A rotina de exercícios, treinamentos e patrulhas (mais recentemente, também de distribuição de alimentos) é rígida. Cada integrante serve por seis meses, com apenas 15 dias de folgas para ver a família.
Mas há compensações difíceis de imaginar num pelotão brasileiro. A base tem internet sem fio, loja de conveniência com chocolates e charutos, sala de jogos e campo de futebol.
Há ainda uma igrejinha e atividades culturais, como uma roda de berimbau. Aos sábados, a área em frente ao portão principal abriga a famosa "feirinha do Brabatt", em que haitianos vendem artesanato, bugigangas em geral e roupas usadas -algumas, doações vindas do exterior que acabam abastecendo um mercado negro local.
A estrutura é considerada tão boa que o Exército brasileiro vive oferecendo hospedagem para outros contingentes. Na semana passada, abrigou um grupo de uruguaios.
Em volta da base, dezenas de haitianos se concentram todos os dias, esperando a chance de fazer um bico, conseguir um emprego ou oferecer uma corrida de carro ou moto.
Muitos falam português, após aulas oferecidas pelo batalhão. Mas, para outros, a sala de aula é um morro atrás de um dos altos muros da base, onde passam horas conversando com os sentinelas de plantão.
(FÁBIO ZANINI E LUIS KAWAGUTI)


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