São Paulo, terça-feira, 31 de março de 2009

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Cúpula árabe apoia rechaço à prisão de Bashir

Manifestação a favor de ditador sudanês, que teve prisão pedida pelo TPI, é raro consenso em bloco rachado

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A DOHA

Sem esconder as muitas divergências que os separam, os países da Liga Árabe tiveram ontem em Doha um raro momento de consenso ao apoiar o ditador do Sudão, Omar al Bashir, e rejeitar a ordem de prisão emitida contra ele pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).
A mesma solidariedade será solicitada hoje aos líderes sul-americanos, durante a reunião de cúpula com os países árabes, que ocorrerá também na capital do Qatar. A presença de Bashir em Doha, em desafio à denúncia por crimes contra a humanidade, cria um constrangimento ao Brasil e outros países da região signatários do TPI.
A declaração final da cúpula estabelece um grupo para buscar o indiciamento de responsáveis por crimes de guerra na recente ofensiva israelense em Gaza. Além disso, dá um ultimato, advertindo que a Iniciativa de Paz Árabe de 2002 poderá perder efeito se Israel não se mostrar disposto a negociar.

Parcialidade
Recebido em Doha com todas as honras pelo emir do Qatar, Sheik Hamad bin Khalifa al Thani, Bashir teve ontem o apoio que buscava na cúpula anual da Liga Árabe. Seus membros acusam o TPI de parcialidade ao indiciar o Sudão, mas não os autores de supostos crimes cometidos nos territórios palestinos e no Iraque.
O ditador da Síria, Bashar al Assad, deu o tom do apoio a Bashir com o discurso que abriu a cúpula árabe. "O que está acontecendo com o Sudão é mais um capítulo dos esforços para enfraquecer os árabes. E mais uma etapa no esforço para destruir o Sudão", disse.
Antes de ganhar a palavra, Bashir passou por um mal-estar, quando o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, criticou com veemência a decisão do Sudão de expulsar 13 organizações humanitárias internacionais da região de Darfur depois da emissão da ordem do TPI.
"Estou extremamente preocupado com a decisão do governo de expulsar organizações humanitárias e de suspender outras que garantem a sobrevivência de mais de um milhão de pessoas", disse Ban.
Mas Bashir, que é acusado por crimes na região de Darfur, onde a ONU estima que cerca de 300 mil pessoas morreram desde 2003, manteve-se desafiador. Agradeceu o apoio dos países árabes e pediu o cancelamento do mandado de prisão. Dentro da Liga Árabe há divisões entre os que são a favor do cancelamento e os que preferem sua suspensão por um ano.
"Somos contra o indiciamento de Bashir, mas queremos que a suspensão ocorra no Conselho de Segurança da ONU", disse à Folha o secretário-geral da Liga Árabe, Amr Moussa, mencionando um mecanismo no organismo da ONU que permitiria congelar o indiciamento por um ano, e que poderia ser renovado.
Dos 22 membros da Liga Árabe, só 3 são signatários do TPI -Jordânia, Comoros e Djibuti-, portanto com obrigação de cumprir o mandado de prisão contra Bashir. Uma das tensões surgidas na cúpula foi causada pela exigência do Sudão de que eles se retirem do TPI, o que foi rejeitado.
Logo no início da cúpula, o ditador líbio, Muamar Gaddafi, rompeu com qualquer ilusão de unidade árabe. Inconformado por não ter o direito de falar, atacou o rei Abdullah, da Arábia Saudita, um antigo desafeto, e abandonou o salão de conferência. Mais tarde, os dois se reuniram, mas a imagem de união que a cúpula tentou projetar já estava em pedaços.


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