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Doações milionárias inflam pleito mais caro da história
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
AS CAMPANHAS DE GEORGE W. Bush e John Kerry
não foram só as mais caras da história dos EUA -mais de
US$ 240 milhões cada uma. Também tiveram as mais astronômicas doações individuais. A maior delas (US$ 23,6 milhões) foi feita a Kerry pelo megainvestidor de origem
húngara George Soros. O democrata recebeu ainda US$
23,1 milhões do empresário de seguros Peter Lewis e US$
13,5 milhões de Steven Bing, produtor de Hollywood.
São dados atualizados do Center for Responsive Politics, uma
das ONGs que monitoram os circuitos do dinheiro das campanhas presidenciais americanas.
Herbert Alexander, professor
da Universidade do Sul da Califórnia e autor de "Financing Politics: Money, Elections and Political Reform" (financiando a política: dinheiro, eleições e reforma
política), disponível só em inglês,
disse à Folha que, segundo o Imposto de Renda americano, 49 cidadãos desta vez doaram US$ 1
milhão ou mais.
A campanha de Bush também
se beneficiou de grandes doadores individuais. Alexander Spanos, magnata do setor imobiliário
da Califórnia, deu US$ 5 milhões.
Carl Lindner, do setor financeiro,
deu US$ 1,8 milhão, e Jerrold Perenchio, proprietário de TVs hispânicas, US$ 3 milhões.
O jornal "Washington Post" publicou há duas semanas levantamento segundo o qual, na campanha de Kerry, para cada US$ 10 arrecadados, US$ 8 vieram de doadores de mais de US$ 250 mil.
Pequenas doações
Alexander afirma que esse quadro contrasta com a idéia da Lei
McCain-Feingold, promulgada
em 2002 e que tentava pulverizar
o orçamento
de campanha a
partir de pequenas doações. Elas existiram aos milhares -quantias de US$ 25,
US$ 50 ou US$
100- e foram
sobretudo feitas por meio da
internet.
O site do
"New York Times", por
exemplo, trouxe um anúncio
pró-Kerry que
dava acesso a
um formulário que o eleitor
preenchia com o valor doado e o
número de seu cartão de crédito.
Esse dinheiro individual foi
também arrecadado por ONGs
que se formaram como "comitês
527", número de um artigo do
Código do Imposto de Renda.
O Center for Public Integrity,
entidade que também faz o acompanhamento de gastos eleitorais,
revelou há dias em estudo que
US$ 175 milhões foram arrecadados por 28 comitês formados para
favorecer ou montar obstáculos
para a reeleição de Bush.
É ainda Herbert Alexander
quem esclarece: o dinheiro miúdo, até US$ 2.000 por doador, pode financiar anúncios de TV que
promovem diretamente o presidente ou seu adversário. Mas,
com o dinheiro dos 527, pagam-se anúncios que dão um recado,
sem no entanto pedir o voto do
eleitor.
É o caso de anúncios que acusaram a Reforma Tributária de
Bush de "apenas favorecer os
americanos mais ricos". Acusação benéfica a Kerry.
O fato é que os comitês 527 criaram um circuito emaranhado e
confuso de circulação do dinheiro. Vejamos as doações do milionário republicano Carl Lindner.
Ele as fez para uma ONG chamada Progresso para a América
(US$ 750 mil), para uma entidade
partidária, a Associação dos Governadores Republicanos (US$
200 mil) e para dois outros grupos
favoráveis a Bush.
Essas doações não esgotam os
canais pelos quais o dinheiro circulou. Há ainda os Comitês de
Ação Política, conhecidos pela sigla em inglês PACs. São entidades
empresariais, sindicais, grupos
ambientalistas ou de minorias étnicas. Só podem recolher doações
de indivíduos de no máximo US$
2.000. Eles se organizam de acordo com as normas eleitorais, ao
contrário dos comitês 527, que
são regidos pela legislação do Imposto de Renda.
Os PACs pró-Kerry arrecadaram US$ 782 mil dólares. Os pró-Bush, bem mais: US$ 2,9 milhões.
Organizações não-partidárias
Uma terceira forma de arrecadar dinheiro está nas organizações não-partidárias. Apesar do
nome, fazem em geral campanha
por um dos concorrentes, como o
demonstrou recentemente o
"New York Times". Esforçar-se
para registrar eleitores em bairros
predominantemente negros é favorecer os democratas.
O exemplo mais competente é o
de uma entidade chamada ACT
(America Coming Together). Depois de amanhã ela telefonará para os eleitores inscritos como democratas, exortando-os a votar.
E fará algo que
no Brasil é crime
eleitoral: só na
Flórida alugará
1.200 peruas para transportar
eleitores aos locais de votação.
Existem, por
fim, três outras
formas de arrecadar e gastar dinheiro para eleger um presidente dos Estados
Unidos.
A primeira é
mais simples, e
consiste em permitir que o candidato gaste uma parte de sua fortuna pessoal.
A segunda está nas doações feitas aos partidos. Um indivíduo
pode doar no máximo US$ 20 mil.
E há, em último lugar, o dinheiro
público. O Tesouro americano já
liberou para os cofres de campanha de George W. Bush e John
Kerry dois cheques de US$ 75 milhões cada um.
Eleições de 1960
Os dois candidatos poderiam
ter recebido financiamento público antes das convenções de seus
partidos. Mas abriram mão desse
privilégio porque, para tanto, deveriam limitar seus gastos.
Calcularam que, sem limitações
oficiais, arrecadariam mais. Na
reta final as regras são mais flexíveis. É por isso que, nessa fase,
aceitaram o dinheiro.
Em 1960, quando John Kennedy
derrotou Richard Nixon, cada um
gastou entre US$ 10 milhões e
US$ 15 milhões, em valores de hoje, diz Herbert Alexander.
Em 1972 -são estimativas, pois
a contabilidade eleitoral era menos transparente- já se gastava
até US$ 40 milhões nos comitês de
Nixon e do democrata que ele
derrotou, George McGovern.
Quantias que representam um
décimo do que George W. Bush e
John Kerry estão agora gastando.
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