UOL


São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Notificação de acidentes é menor entre pequenas; prevenção só é adotada após os problemas surgirem

Descaso não aparece nas estatísticas

FREE-LANCE PARA A FOLHA

As micro e pequenas empresas são as principais responsáveis pelos acidentes que não chegam às estatísticas oficiais no país, de acordo com especialistas. Além de investirem menos em segurança e prevenção, notificariam com menor frequência os acidentes ocorridos em suas instalações.
"As pequenas e as microempresas são as responsáveis pelo que não aparece", diz Armand Pereira, diretor da OIT (Organização Internacional do Trabalho) no Brasil. "As estatísticas estão melhorando no mundo e no Brasil. Mas são limitadas, não incluem a economia informal, que é onde o emprego está crescendo."
Mauro Daffre, presidente da ABPA (Associação Brasileira para a Prevenção de Acidentes), que coordena a campanha nacional de prevenção de acidentes da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e do Sesi (Serviço Social da Indústria), afirma que as empresas menores não notificam por medo e por desinformação.
"Muitos empresários não sabem o que é acidente do trabalho, outros não sabem como notificar. Mas muitos deixam de fazer porque estão na clandestinidade."

Gato escaldado
Para cumprir a lei, todas as empresas precisam ter programas de controle médico de saúde ocupacional e de prevenção de riscos ambientais. "A maioria só resolve cumprir a exigência quando já ocorreu um acidente ou quando sofre fiscalização. Isso só gera problemas trabalhistas", explica Sandra Regina Fiorentini, consultora jurídica do Sebrae-SP.
O empresário Paulo José Diebe, 43, que tem 45 funcionários, afirma que o investimento em segurança compensa e já se tornou um hábito em sua empresa, que atua no ramo de acabamentos em aço.
"Na metalurgia, é difícil [encontrar] uma empresa em que não tenha havido um acidente." O último problema em sua firma, segundo ele, ocorreu em dezembro e produziu mudanças nos treinamentos. "Acidente é perda de mão-de-obra e de produtividade. Às vezes, são coisas simples. Um pedaço de ferro soldado no lugar certo já pode fazer diferença."
De 1999 a 2001, os dados oficiais registraram queda de 34% no número de acidentes fatais no Brasil -principal alvo de ações de entidades como a CUT (Central Única dos Trabalhadores). "Investir em segurança evita prejuízos para todos", diz Edilson de Paula Oliveira, presidente da CUT-SP.
Entre os informais, um dos setores mais vigiados pelo Ministério Público Estadual é o das marmorarias -que reúne grande número de pequenas empresas com empresários e funcionários expostos a substâncias perigosas.
"São empresas familiares, em que todos correm o risco de ter silicose [doença que leva ao endurecimento dos pulmões, causada pelo acúmulo de sílica]", afirma Anna Trotta Yaryd, promotora de Justiça de Acidentes do Trabalho, setor de prevenção.

"Simples"
De acordo com a OIT, desde 1960 só dois países no mundo ratificaram mais convenções de saúde e segurança da entidade do que o Brasil: Suécia e Finlândia.
Entre os projetos em discussão no Ministério do Trabalho e Emprego para combater acidentes, está o que cria uma espécie de "Simples" para incentivar que as pequenas empresas sigam as normas de segurança e saúde.
A idéia, apresentada pela Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho), é que as empresas em situação irregular possam procurar o governo para pedir orientações sem correr o risco de serem fechadas ou multadas. Aceitando compromisso de atingir certas metas, a firma ganharia um prazo para entrar na linha.
Outra proposta no ministério é a criação de microcrédito para financiar ações de prevenção e a compra de equipamentos de proteção coletiva e individual.
Segundo o ministro do Trabalho e Emprego, Jaques Wagner, o medo do desemprego é um dos fatores que atualmente fazem crescer o risco de acidentes. Ele diz que o problema é "questão de honra" para o atual governo.
Wagner, como o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, já se acidentou no trabalho. "Tive o rosto queimado em 1976, na ruptura de uma linha de ácido sulfúrico em uma indústria petroquímica. Quase fiquei cego."



Texto Anterior: Empresário também está exposto a risco
Próximo Texto: Feira: Pequena indústria domina máquinas
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.