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Egípcias lutam por direitos

Por DAVID D. KIRKPATRICK

CAIRO - Num primeiro momento, Samira Ibrahim teve medo de contar a seu pai que soldados egípcios a prenderam na praça Tahrir, no Cairo, arrancaram suas roupas e ficaram assistindo enquanto ela era submetida a um "exame de virgindade" forçado.

Mas quando seu pai, um conservador religioso, viu as marcas deixadas em seu corpo por uma arma de choque elétrico, isso trouxe de volta as memórias de quando ele próprio tinha sido preso e torturado, sob o governo do ditador Hosni Mubarak.

"A história está se repetindo", ldisse seu pai. Juntos, pai e filha juraram mover uma ação na Justiça contra os governantes militares, "para reivindicar meus direitos", disse Samira.

A ação está correndo na Justiça, por enquanto, com êxito. Em dezembro, pela primeira vez, um tribunal administrativo contestou a autoridade do conselho militar e proibiu a realização de "exames" de virgindade. Samira Ibrahim pediu a um tribunal militar que punisse os oficiais.

Sua história ilustra a posição paradoxal das mulheres no Egito. Depois de a revolução ter imbuído muitas mulheres da coragem de reivindicar uma nova voz na vida pública, muitas estão constatando que ainda são dependentes da proteção de homens.

Nos dias instigantes da revolução, quando feministas egípcias exerceram um papel ativo, lado a lado com os homens, para derrubar o ditador Mubarak, elas não esperavam que, depois, as mulheres fossem continuar na mesma posição de dependência. "Mudar a cultura patriarcal não é tão fácil", comentou Mozn Hassan, 32, diretora do grupo Nazra de Estudos Feministas.

Mulheres que participavam de manifestações foram sexualmente agredidas por soldados egípcios, que são protegidos pelos tribunais militares. Grupos de defesa dos direitos humanos dizem que documentaram os casos de pelo menos cem mulheres que sofreram agressões sexuais por parte de soldados ou membros da polícia durante o governo militar -incluindo a mulher anônima filmada em vídeo em dezembro ao ser espancada por soldados na praça Tahrir. Os militares arrancaram as roupas da mulher, expondo seu sutiã azul.

Há extremistas religiosos que querem reverter alguns dos direitos que as mulheres possuem. A Irmandade Muçulmana conquistou metade dos votos no Parlamento e os salafistas, mais extremistas, ficaram com 25%.

Enquanto líderes da Irmandade falam em incentivar os papéis tradicionais, mas respeitar as opções profissionais das mulheres, muitos salafistas defendem que elas não devem ser autorizadas a exercer funções de liderança e propõem a regulamentação de questões como a vestimenta feminina, para impor os padrões islâmicos de discrição.

As mulheres quase não exercem papéis de liderança nos grupos ativistas formados a partir dos protestos que levaram à queda de Mubarak. No primeiro Parlamento democraticamente eleito, que se reuniu pela primeira vez em 23 de janeiro, menos de 10 das 500 vagas são ocupadas por mulheres. Os debates eleitorais incluíram poucas menções a questões relativas às mulheres -desde a onipresença da mutilação genital feminina até a discriminação legalmente sancionada no trabalho-, a despeito das estatísticas oficiais que mostram que um terço das famílias egípcias depende dos salários ganhos por mulheres. "Não temos um movimento feminista", disse Hala Mustafa, editora do jornal estatal "Democracy".

No entanto, algumas pessoas argumentam que a revolução estaria ajudando a revitalizar o dormente movimento feminista, ao proporcionar uma abertura política, fato que permitiu a Samira Ibrahim ter seu dia no tribunal. "Essa é a diferença que a revolução egípcia fez", comentou a veterana ativista dos direitos humanos Ghada Shabandar. "A muralha de medo caiu."

Seis outras mulheres foram submetidas a "exames de virgindade" pelos soldados quando Samira foi agredida. Ela disse que a humilhação foi tão grande que desejou morrer. Quando ela viu o vídeo da "moça do sutiã azul" sendo espancada, isso reforçou sua determinação. "Senti que eu precisava vingar essa mulher."

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