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Sinais de tortura se espalham pela Líbia

POR LIAM STACK

CAIRO - Torturas e mortes nas cadeias se disseminaram na Líbia do pós-guerra, denunciaram grupos humanitários no fim de janeiro, num perturbador sinal de que alguns abusos da era Gaddafi continuam ocorrendo sob o fraturado domínio do governo provisório nacional e de milícias regionais.

A Anistia Internacional declarou em um comunicado que vários detentos já foram torturados até a morte "por entidades militares e de segurança oficialmente reconhecidas", e também por "uma multidão de milícias armadas".

Representantes da Anistia se reuniram com detentos nas regiões de Trípoli, Misrata e Gherian, e viram pessoas feridas com lesões compatíveis a torturas, incluindo machucados abertos em cabeças, nos membros e nas costas.

A maioria das vítimas era de líbios leais ao ditador Muammar Gaddafi durante os nove meses do conflito que levou à derrubada e morte dele; outros, porém, eram africanos subsaarianos. Durante a revolução, africanos de fora da Líbia foram acusados de serem mercenários a serviço de Gaddafi.

A ONG Médicos Sem Fronteiras anunciou que irá suspender suas operações nas penitenciárias de Misrata, e explicou que alguns dos 115 detentos tratados desde agosto com ferimentos provocados por torturas voltaram repetidamente, com mais lesões.

A Human Rights Watch documentou haver "tortura em curso" nos últimos seis meses nas prisões líbias, de acordo com Sidney Kwiram, investigadora da entidade, que monitora desde abril as condições carcerárias na Líbia, e desde maio as de Misrata (oeste).

Ela disse que a persistência da tortura é menos um reflexo das políticas adotadas pelo governo provisório do que da fraqueza das instituições líbias após nove meses de guerra civil e quatro décadas do regime de Gaddafi.

"Em alguns casos, os comandantes aqui formam seus próprios feudos, então não importa o que o governo está dizendo", afirmou Kwiram. "O que importa é quem está no controle. Há limites pontilhados entre os níveis nacionais e locais, e eles precisam se tornar não-pontilhados."

O refugiado Gheit Abubakr, 46, que está acampado em Trípoli, levava a certidão de óbito do seu irmão cuidadosamente dobrada no bolso do sobretudo, junto com uma dúzia de fotos do cadáver mutilado dele.

Abdulla, 36, seu irmão, foi detido em 13 de setembro pela Brigada Sumoud, de Misrata.

Um amigo de Misrata em um posto de controle em Trípoli contou à família que o corpo do rapaz poderia estar em um hospital próximo dali.

Parentes foram ao hospital, onde acharam o cadáver. A família pediu ajuda de policiais, mas eles, segundo Abubakr, ficaram "com medo da milícia".

"A polícia disse: 'Não podemos fazer nada, porque todo mundo tem uma arma agora'", afirmou. "Não podemos ajudá-lo e não podemos ir com você conversar com a Brigada Sumoud", teriam lhe dito os policiais. Segundo Abubakr, seu irmão foi agredido até a morte, "mas ele não fez nada - ele não estava entre os militares e não tinha uma arma".

A alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Navi Pillay, disse ao Conselho de Segurança que está preocupada com a tortura e outros problemas nas prisões líbias "terceirizadas".

O governo já tentou dizer aos responsáveis pelos presos que quem não tiver cometido crimes nem participado de "massacres" deve ser solto, disse ao Conselho o embaixador líbio junto à ONU, Abdurrahman Shalgam.

Ele informou que há mais de 8.000 prisioneiros só em Trípoli, mas não especificou quantos estão fora do controle do governo.

O governo central estabeleceu dois prazos, um em novembro e outro em dezembro, para que milícias de fora da cidade deixassem a capital, mas ambos os ultimatos foram ignorados.

Neil MacFarquhar contribuiu com reportagem da ONU

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