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O ensino tibetano, num cenário improvável

POR DAN LEVIN

ZHANDETAN, China - Todas as manhãs, dezenas de meninos e rapazes vêm às recém-construídas salas de aula ao pé de uma das mais sagradas montanhas do budismo tibetano -a seis horas da cidade mais próxima e longe do olhar circunspecto dos tecnocratas do Partido Comunista. Eles aprendem a escrever as sinuosas letras do alfabeto tibetano e recebem as primeiras noções de uma história, cultura e religião que muitos tibetanos consideram ameaçadas de extinção.

"A língua tibetana é a chave para a nossa cultura e sem ela todas as nossas tradições ficarão trancadas para sempre", disse o monge Abo Degecairang, 25, aluno da primeira turma matriculada no Centro Cultural Tibetano Anymachen, inaugurado em setembro na província chinesa de Qinghai.

Mais notável do que sua localização é o fato de o governo chinês ter autorizado o "rinpoche" Tserin Lhagyal, 48, fundador e guia espiritual da escola, a instalar uma instituição autônoma dedicada à promoção da cultura e da língua tibetanas.

Embora as áreas tibetanas da China estejam repletas de monastérios budistas, sua atribuição é ensinar a devoção religiosa por intermédio de textos antigos e longos períodos de oração. A escolaridade não-religiosa é geralmente controlada pelo Estado. A pobreza e o isolamento geográfico privam muitas crianças de qualquer educação formal.

Foi a esses jovens que o "rinpoche" -um título concedido aos mais graduados professores do budismo- se voltou na esperança de lhes proporcionar um futuro que ajude a preservar o patrimônio cultural tibetano.

Hoje, 30 meninos pastores, órfãos e monges noviços aprendem os fundamentos da cultura tibetana, além de terem aulas dos idiomas mandarim e inglês.

"Os monastérios só ensinam budismo aos monges, mas não ensinam tudo sobre como ser um tibetano", disse Lhagyal, que alcançou o status de "Buda vivo". "Do ponto de vista cultural, trata-se de uma emergência."

Tal preocupação, partilhada por inúmeros tibetanos, alimenta os distúrbios étnicos que assolam as áreas tibetanas da China nos últimos anos. Os protestos contra o controle chinês têm se intensificado. Desde março de 2011, ao menos 11 tibetanos morreram após se imolarem.

Quem veio viver no centro cultural viu seu mundo ser profundamente alterado. Alguns, como Tuzansanzhi, 19, um jovem tímido vestido de monge, e que como muitos tibetanos usa um só nome, nunca havia ido à escola.

"Sou filho único, e meus pais precisavam de mim para cuidar das ovelhas", afirmou, em tibetano. Antes de chegar, em julho, Tuzansanzhi era analfabeto. Agora, traça o alfabeto tibetano de forma clara e uniforme.

Vestindo um agasalho esportivo azul, Jiuxuejop, 18, contou que a escola o salvou de um futuro ao qual parecia fadado.

"Eu não quero ser pastor", disse ele. "Fiz isso por mais de dez anos, é muito cansativo. É melhor ser professor e manter viva a cultura tibetana."

Mia Lee contribuiu com pesquisa

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