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Barragens ameçam o modo de vida cambojano

Por SIMON MARKS

KAMPOT, Camboja - A economia do Camboja cresceu 6,5% no ano passado, segundo o Fundo Monetário Internacional, e para acompanhar a demanda o governo quer aumentar em dez vezes a produção de energia, para mais de 10 mil megawatts. A enorme companhia chinesa Sinohydro começou a trabalhar aqui na usina de Kamchay, de 193 megawatts, em 2007, e outras 20 hidrelétricas estão planejadas.

O Camboja quer vender para outros países uma parte da eletricidade gerada por suas usinas, reduzir a dependência das importações de energia, reduzir seus custos e gerar empregos.

"Os benefícios esperados desses projetos são enormes", disse Maria Patrikainen, analista da IHS Global em Londres, incluindo "energia mais verde e uma diversidade maior de fontes energéticas". No entanto, ela e ambientalistas disseram que as represas causariam mais prejuízos que benefícios. A ameaça mais preocupante, segundo alguns, é para a segurança alimentar de uma população rural que depende fortemente dos peixes como fonte de proteína.

"As grandes barragens perturbam os ecossistemas dos rios, bloqueiam rotas migratórias vitais para os peixes e impedem que sedimentos ricos em nutrientes sigam corrente abaixo para as hortas e arrozais nas margens dos rios", disse por e-mail Ame Trandem, diretora de programa para o sudeste asiático da organização americana International Rivers.

Ela acrescentou: "As grandes barragens vão aumentar a brecha entre ricos e pobres, elevar os níveis de desnutrição e levar a um futuro ambientalmente insustentável".

Os ambientalistas dizem que essas barragens vão evitar o fluxo dos sedimentos para o lago Tonle Sap, no Camboja, o maior lago do sudeste asiático, e o delta do rio Mekong no Vietnã. É no delta que 40% do arroz do Vietnã são cultivados, a maioria dos peixes é pescada e onde vivem 17 milhões de pessoas, segundo a comissão do rio Mekong, uma organização com representações da Tailândia, Vietnã, Laos e Camboja.

"Uma parte significativa desses peixes são espécies migratórias", escreveu Marc Goichot, um especialista em energia hidrelétrica do programa da WWF para o grande Mekong, e nenhum sistema para a passagem de peixes através de grandes represas se mostrou eficaz em casos semelhantes.

Ambientalistas dizem que o Camboja deveria trocar as barragens por tecnologias como a energia solar, gaseificação e cogeração, em que o calor gerado pelas usinas é capturado e transformado em energia. Alguns dizem que os projetos de barragens deveriam ser submetidos a rígidas avaliações ambientais e sociais.

David Blake, um candidato a doutorado na Escola de Desenvolvimento Internacional na Universidade de East Anglia, no Reino Unido, disse que os moradores podem ser incluídos nos benefícios da energia hidrelétrica através de programas de distribuição de lucros como os do Canadá. Lá, os povos aborígines recebem parte da receita das usinas hidrelétricas.

A China já construiu quatro barragens no alto rio Mekong.

Em dezembro, os delegados da comissão do Mekong decidiram adiar a construção da represa Xayaburi, no Laos. A decisão foi baseada principalmente em conclusões de um relatório de 2010 do Centro Internacional para Gestão Ambiental, uma consultoria em Melbourne, Austrália.

O relatório advertiu que, se todas as represas propostas no leito principal do Mekong forem em frente, a produção de peixes diminuirá 798 mil toneladas, ou 42% da pesca total de 2000. A metade das hortas à margem do rio também se perderia, enquanto a terra agrícola é inundada para criar reservatórios ou é ocupada por linhas de transmissão, disse o relatório. E 106.942 pessoas poderiam ser expulsas.

Mas Thavry é uma dentre muitos aldeões cuja trilha para colher bambu para os cestos que tecem ficou mais difícil depois da construção da barragem de Kamchay.

"A eletricidade vai correr, mas destruiu minha capacidade de colher bambu", disse.

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