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Orgulho polonês gera nostalgia gastronômica

Por JOANNA BERENDT

VARSÓVIA - Os balconistas do bar, de camisas branca e gravatas borboleta pretas, serviam doses de vodca, seguidas por pratos de arenque no azeite, e de vez em quando uma linguiça kielbasa em pratinhos brancos. A clientela entornava animadamente as bebidas, brindando em polonês: "Na zdrowie!".

Exceto pelas bolsas de grife e pelos onipresentes iPhones, essa poderia ser uma cápsula do tempo, de quando a Polônia integrava a Cortina de Ferro e pequenos bares desse tipo eram comuns. Na época, os poloneses preservavam cuidadosamente sua cultura, seu patrimônio e sua gastronomia contra as garras do capitalismo. Mas com a queda do comunismo, em 1989, novidades ocidentais tomaram conta da capital -coquetéis de rum, fast-foods e comida asiática, por exemplo.

Hoje, os poloneses se sentem bem mais confiantes, abraçando as tradições em vez de saírem correndo atrás da última tendência estrangeira.

Sem lugares para sentar, o Pijalnia Wodki i Piwa ("sala para beber vodca e cerveja") foi aberto em janeiro, como parte de uma leva de bares que brota por toda Varsóvia e fala desse orgulho revivido. Conhecidos como bares "zakaskas", esses novos estabelecimentos tentam recriar o ambiente da era soviética, com uma decoração intencionalmente surrada, pouco ou nenhum mobiliário, e um cardápio barato.

Num deles, só há dois preços: 4 zloty (cerca de US$ 1,25) para todas as bebidas, e 8 zloty (uns US$ 2,50) por petiscos simples. O bar só serve um tipo de cerveja e um de vodca, evocando a falta de opções da época comunista.

"Tudo associado à tradição polonesa ficou identificado como sendo vagabundo e grosseiro, um indicador da suposta origem socioeconômica baixa dos poloneses", disse o sociólogo Tomasz Szlendak. "Aí as pessoas tentaram recriar o mundo da [série de TV americana] 'Dinastia'." Os poloneses se tornaram os maiores consumidores mundiais por capita de sushi depois do Japão, acrescentou ele, e achavam que isso era um sinal de que eles não eram mais um atrasado país comunista, alvo de piadas.

"Eles continuavam comendo o arenque brega em casa, mas quando saíam fingiam que só gostavam de comidas mais refinadas", disse Izabela Skiba, 23, comendo arenque e bebendo vodca num dos novos bares.

Desde o fim do comunismo, os salários na Polônia duplicaram e o padrão de vida melhorou bastante. Segundo uma recente pesquisa de um instituto local, 75% dos poloneses estão satisfeitos com as suas vidas. A pesquisa mensurou o contentamento com a situação financeira, o local de trabalho, a vida familiar e a saúde.

Quando começaram a ficar de bem consigo mesmos, os poloneses passaram a explorar seu passado de várias maneiras, de documentários a romances policiais retrô. Os bares zakaskas se encaixam à perfeição. Mais de 12 já abriram só na capital e o resto do país foi atrás.

"Eu não queria um lugar metido", disse Iwona Sumka, 44, dona de três zakaskas em Varsóvia. "Eu queria algo até um pouco feio, onde as pessoas não iam sentir a necessidade de ostentar."

O Miedzy Wodka a Zakaska ("entre vodca e aperitivo"), que abriu em outubro, é decorado com cadeiras de plástico, castiçais em paredes manchadas de cinza e mesas de madeira compensada. "Eu queria criar um lugar aonde senhoras elegantes pudessem vir sem ficarem constrangidas por tomarem umas doses de vodca", disse ela.

Esses pontos de encontro simples tentam construir um senso comunitário ao combinar várias tradições polonesas. "Zakaska" em polonês significa tira-gosto. Os mais populares, além de arenque no azeite, são o steak tartare, as kielbasas e os patês.

"As pessoas ficam sentimentais", admitiu Roman Modzelewski, 59, balconista do bar Przekaski Zakaski. "Na década de 1980, eu trabalhei em um restaurante mediterrâneo da Suíça. Depois de três meses, só conseguia pensar nos pratos poloneses, como sopa de beterraba com croquetes e 'bigos', que é guisado de carne com repolho."

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