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'Damas de ferro' lutam contra mina em Mianmar

Por THOMAS FULLER

WETHMAY, Mianmar - Elas foram vigiadas por policiais à paisana e xingadas de "vacas" por representantes do governo. Passaram quatro noites na prisão, até que manifestações populares levaram à sua libertação.

As camponesas Aye Net, 34, e Thwe Thwe Win, 29, que completaram apenas o ensino primário, ganharam destaque nacional em Mianmar por combaterem um enorme projeto de mineração de cobre comandado por poderosos militares e uma subsidiária da empresa chinesa de armas Norinco.

"Podem nos pressionar quanto quiserem, não vamos desistir", diz Thwe Thwe Win, entrevistada em seu vilarejo, ao lado da mina. "A luta as converteu em 'damas de ferro'", comentou Ant Maung, poeta renomado que vive em Monywa. "É uma questão de vida ou morte para elas. Elas vão defender sua causa, custe o que custar."

O novo governo civil de Mianmar está dando passos em direção a uma sociedade menos ditatorial. Mas essas mudanças ficam a um mundo de distância da zona rural pobre do país, onde as autoridades continuam a seguir a velha praxe de repressão e assédio.

Em dezembro, o governo tentou forçar os moradores de Wethmay a abandonarem o vilarejo, atacando o mosteiro local com martelos, removendo estátuas budistas e tirando todos os móveis e equipamentos da escola local. Esses e outros incidentes provocaram uma série de protestos e confrontos entre a população e a polícia.

O que está no cerne da questão é o receio de que as terras agrícolas sejam contaminadas com resíduos da mina. Além disso, os ativistas temem um aumento dos casos de grilagem de terras para a mineração, já que as sanções internacionais diminuem e capitais de desenvolvimento e outros investimentos chegam do exterior.

Dois anos atrás, o governo ofereceu casas novas e o pagamento de indenização aos moradores de Wethmay se eles concordassem em deixar suas casas para dar espaço para a mina. Mas, quando apenas um punhado dos moradores aceitou a oferta, as autoridades convocaram uma reunião e disseram às pessoas que elas podiam deixar o vilarejo por conta própria ou ser despejadas.

"Gritaram conosco e nos chamaram de animais", relata Thwe Thwe Win. As autoridades teriam tentado encerrar a reunião, mas ela interveio. "Falei: 'Agora é minha vez'. Apontei meu dedo para o governador: 'O senhor não é um cavalheiro. Não volte a me chamar para esse tipo de discussão.'" Não foi possível obter declarações do governador, que foi substituído.

Os moradores do vilarejo dizem que estão ainda mais determinados a ficar depois de ver o lugar para onde seriam transferidos: um grupo de casas mal construídas num campo sem árvores.

Como a controvérsia em torno da barragem da hidrelétrica Myitsone, outra obra chinesa suspensa no ano passado após protestos populares, o caso da mina de cobre carrega um ranço de sentimento antichinês, algo que é ouvido com frequência em Mianmar. Moradores de Wethmay contam que foram incomodados por funcionários da mina, mas a empresa nega.

Depois de Aye Net e Thwe Thwe Win serem presas, em setembro, antigos presos políticos de destaque negociaram sua soltura.

Geng Yi, diretor e gerente da empresa que opera a mina, Myanmar Wanbao Mining Copper, disse que a empresa, que tem 2.000 funcionários locais, deseja uma convivência positiva com a comunidade local. De acordo com ele, a mina "pode gerar milhares de empregos e contribuir para o desenvolvimento da região".

O governo parece ter desistido de despejar os moradores. Mas as mulheres de Wethmay não querem deixar nada para o acaso. Thwe Thwe Win contou que está lendo uma cópia da Constituição birmanesa de 2008. Durante o governo militar, disse ela, os generais governaram por decreto. "Mas agora sabemos que existem normas."

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