São Paulo, segunda-feira, 01 de março de 2010

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No mar, devagar e sempre

Por ELISABETH ROSENTHAL
O navio de carga Ebba Maersk levou mais de um mês para navegar da Alemanha até Guangdong, na China, onde descarregou em uma sexta-feira recente -uma semana a mais do que demorava dois anos atrás. Mas, para a proprietária do navio, a gigante dinamarquesa da navegação Maersk, a demora representa um progresso.
Em uma cultura global dominada pela velocidade, da entrega de encomendas em 24 horas aos trens-bala e aos saques em caixas automáticos, a companhia adotou um slogan de vendas que poderá assustar clientes corporativos apressados: devagar é melhor.
Ao cortar pela metade suas velocidades máximas de cruzeiro nos últimos dois anos, a Maersk reduziu o consumo de combustível nas principais rotas em até 30%, baixando muito os custos. E a companhia também conseguiu um corte equivalente nas emissões de gases-estufa dos navios.
"O enfoque anterior era no preço e na rapidez da entrega", disse Soren Stig Nielsen, diretor de sustentabilidade da Maersk, salientando que a prática começou em 2008, quando o preço do barril de petróleo saltou para US$ 145. "Mas, hoje, existe uma terceira dimensão", disse. "Qual é a pegada de CO2?"
Viajar mais lentamente, acrescentou, é "uma ótima oportunidade" para cortar emissões "sem um salto em inovação".
As emissões dos transportes dispararam nas últimas três décadas, enquanto o comércio global crescia rapidamente.
O mantra era "preciso disso agora". Mas o resultado é que aviões, navios, carros e caminhões costumam viajar em velocidades muito acima da eficiência máxima de consumo. Reduzir as velocidades diminui as emissões porque reduz o empuxo e o atrito. Esse princípio é verdadeiro no ar e na terra. Os aviões poderiam reduzir as emissões desacelerando 10%, acrescentando apenas cinco ou seis minutos a uma viagem entre Nova York e Boston ou entre Copenhague e Bruxelas, disse Peder Jensen, especialista em transporte da Agência Ambiental Europeia.
"Existe uma sensação de urgência que nós criamos", disse Tim Castleman, fundador do grupo americano Projeto de Conservação Drive55.
É claro que a navegação, mesmo em velocidades convencionais, é muito mais eficiente que o tráfego rodoviário. Transportar por navio uma tonelada de brinquedos de Xangai até a Alemanha gera menos emissões do que levá-la depois até Berlim de caminhão.
"Inicialmente havia ceticismo", disse Philip Damas, diretor da Drewry Shipping Consultants, em Londres.
"Todos os navios são construídos com a expectativa de que têm de navegar depressa."
Mas hoje, ele disse, os cargueiros de Alemanha, Israel ou China começam a adotar outra estratégia. Mais de 220 navios já praticam a "navegação lenta" -trafegando a 20 nós em alto-mar em vez dos 24 ou 25 habituais- ou, como os navios da Maersk, a "navegação superlenta", a 12 nós.
E muitas companhias acham que essa prática permite reduzir os custos, em escala significativa num eventual aumento nos preços dos combustíveis.
Reduzir as velocidades é uma boa ideia, disse David Bonilla, pesquisador sênior de estudos de transportes da Universidade de Oxford, mas ele afirma que por si só ela não pode conter o crescimento das emissões resultante dos padrões comerciais de hoje, em que vastas quantidades de bens são produzidos na Ásia mas consumidos em Europa ou EUA.
Para fazer uma diferença, ele disse, os custos do combustível para navegação de longa distância devem aumentar a ponto de as companhias serem obrigadas a investir em novos navios muito mais eficientes ou mudar para rotas mais curtas.
"Talvez seja preciso mudar a localização das fábricas nas cadeias de fornecimento internacionais, para encurtar a distância entre produção e consumo", acrescentou. "Mas é difícil fazer isso."
Mas a Maersk se considerou precavida: está certa de que um imposto de carbono ou regras de navegação mais rígidas estão no futuro próximo. "O problema não vai desaparecer, e quem começar a enfrentá-lo desde já estará à frente", disse Nielsen.


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