São Paulo, segunda-feira, 01 de agosto de 2011

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Oslo é uma cidade dividida

Oslo
Oslo é uma das capitais mais agradáveis e tranquilas da Europa, mas é uma cidade dividida. O lado oeste é rico, seguro e predominantemente branco; o leste, mais pobre, menos seguro e povoado por imigrantes, muitos deles muçulmanos.
A Noruega endureceu seus regulamentos liberais de imigração e asilo, em meio a um antigo debate sobre assimilação e multiculturalismo. Apesar da riqueza em petróleo e do baixo desemprego no país, tem havido crescente preocupação sobre o aumento da população muçulmana, especialmente depois dos atentados de 11 de Setembro e da crise dinamarquesa no final de 2005, causada pela publicação de charges mostrando Maomé, que também foram publicadas na Noruega.
Mas a população muçulmana está crescendo, e o islã já é a segunda maior religião na Noruega. O impacto de uma população muçulmana crescente e cada vez mais visível em um país relativamente monoétnico, liberal e igualitário levou a um surto de popularidade do Partido do Progresso, anti-imigração, hoje o segundo maior no Parlamento. E parece ter sido um dos gatilhos do massacre de julho, cometido contra a elite branca da Noruega. O suspeito, Anders Behring Breivik, afirma que foi levado a agir pelo fracasso dos políticos da corrente dominante em conter a maré islâmica.
Esse argumento parece exagerado. A Noruega, com 4,9 milhões de pessoas, tem cerca de 550 mil imigrantes, cerca de 11% da população, mas 42% deles têm a cidadania norueguesa. A metade seria de europeus brancos, especialmente poloneses e suecos, que vêm para conseguir melhores salários.
Mas o número de imigrantes na Noruega quase triplicou entre 1995 e 2010, e os muçulmanos tendem a ter famílias maiores.
Seja por simples questões econômicas, pelo desejo de viver com outros muçulmanos ou por causa de políticas de bem-estar social falhas, algumas cidades têm guetos informais com forte índice de imigração que bloqueiam a assimilação à língua, cultura e sociedade norueguesas.
No bairro oriental de Furuset, com sua grande nova mesquita, os imigrantes superam os noruegueses, que estão deixando a área. Um parque da cidade contém uma estátua de Trygve Lie, o ex-ministro das Relações Exteriores no exílio durante a Segunda Guerra Mundial que se tornou o primeiro secretário-geral da ONU, um símbolo da resistência norueguesa e do seu compromisso com a responsabilidade internacional.
"Quando me mudei para cá em 1976, era um bairro novo e só havia noruegueses", disse Lisbeth Norloff, uma professora de norueguês.
"Hoje, há muito poucos, e alguns estão indo embora." Em suas aulas, ela diz que só tem dois estudantes nativos dentre 40 e teve de baixar os padrões de ensino, já que muitos dos seus alunos não falam norueguês em casa. "Acho que os dois lados estão perdendo", ela disse.
Harald Stanghelle, o editor de política do jornal "Aftenposten", disse que hoje em Oslo há muitas escolas onde a maioria dos alunos não vem de famílias que falam norueguês. "Isso provocou um novo tipo de debate", ele disse.
Em geral, esse debate trata de como integrar os imigrantes em um pequeno país com uma língua difícil, se eles não conseguirem falar bem o idioma.
Embora o debate seja o mesmo em outros países da Europa Ocidental, a Noruega é estável, rica e tem baixo desemprego. Por esses motivos, a concorrência por empregos não é uma questão tão importante. Outra diferença é que a Noruega tende a aceitar como refugiados vítimas mais pobres de conflitos -como o povo dos barcos vietnamita décadas atrás ou somalis e eritreus hoje.
Esses refugiados não têm boa instrução, e muitos passaram por experiências terríveis, por isso são mais difíceis de assimilar, pelo menos até a segunda ou terceira geração.
Um membro do Partido do Progresso que pediu o anonimato disse que há mais consenso hoje na Noruega sobre uma política mais dura e restritiva. "Nossas políticas imigratórias foram extremamente ingênuas e nossas políticas de integração também, mas isso é algo que todos os nossos partidos políticos reconhecem", ele disse.
No passado, qualquer crítica à imigração ou ao asilo era considerada racista, "mas isso foi de modo geral reparado", ele disse. "Estamos tendo um verdadeiro debate sobre imigração e integração, além de uma eleição a cada quatro anos. Somos um país de consenso, esta é a Noruega, e estamos juntos." Arne Strand, ex-editor de política do jornal "Dagsavisen", considera Breivik um "cavaleiro solitário", cujo manifesto confuso não representa qualquer corrente real de pensamento na Noruega, exceto uma pequena faixa da direita. Mas ele acha que o massacre terá algum impacto na política. "Esse assassinato em massa levantará novamente o debate, e haverá eleições locais no mês que vem", ele disse.
O debate também é real entre os imigrantes em Furuset.
Yemane Mesghina, 39, chegou aqui nove anos atrás como refugiado da Eritreia e é grato aos noruegueses. Um faxineiro, ele vive em Furuset porque, como diz, "é barato". O bairro é dominado por paquistaneses, que chegaram ao país como trabalhadores convidados nas décadas de 1970 e 1980, quando a Noruega precisava de mão de obra.
Cerca de 90% das pessoas em seu prédio de apartamentos são paquistaneses, disse Mesghina. E o bairro também é malfalado por causa do bando criminoso paquistanês.
Mesghina diz que se preocupa com seu filho, e como ele poderá se integrar à vida norueguesa tendo tão poucos noruegueses ao seu redor.
"Temo que meu filho não aprenda a verdadeira língua norueguesa", ele disse.
Mas, como muitos aqui, não estava extremamente preocupado que a chacina cause uma nova pressão contra os muçulmanos. "O mais importante é o que a maioria pensa", ele disse. "E a maioria está a nosso favor."


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