São Paulo, segunda-feira, 03 de maio de 2010

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Sucata importada levanta temor de radiação na Índia

Por JIM YARDLEY

NOVA DÉLI - Uma caminhada em meio à sujeira e pobreza de Mayapuri, zona industrial imunda composta de centenas de pequenos ferros-velhos, proporciona uma visão dos detritos industriais do mundo: toneladas de canos de ferro enferrujados, vigas de aço retorcidas, objetos de cobre e outros materiais descartados vindos de Europa, Rússia, Japão e EUA, além da própria Índia.
E há também o que chegou recentemente a um pequeno ferro-velho pertencente a Deepak Jain: pedaços de metal vistos como responsáveis por um recente incidente de radiação que levou sete pessoas ao hospital e fez a polícia barrar temporariamente o acesso a uma área situada a apenas 16 km do Parlamento indiano.
"Nunca antes tivemos um problema como este", disse Krishna Kumar Jain, dono de outro ferro-velho e cunhado de Deepak Jain. "As pessoas estão com tanto medo que ninguém mais está vindo aqui."
A Índia e outros países em desenvolvimento, especialmente a China, vêm há anos importando lixo de diferentes tipos de países desenvolvidos. Trata-se de um negócio lucrativo, embora controverso.
Críticos culpam a importação de equipamentos de informática descartados, conhecidos como e-lixo tóxico, por males de saúde crônicos dos trabalhadores de ferros-velhos e por danos ao meio ambiente.
Mas o problema que surgiu em Mayapuri representa uma ameaça potencialmente mais séria. No momento em que Índia e outros países em desenvolvimento importam quantidades crescentes de sucata metálica, especialistas dizem que o monitoramento insuficiente nos portos e a ausência de padrões internacionais faz com que seja mais fácil que materiais radiativos e outros objetos perigosos atravessem fronteiras. As divisas da Índia têm se mostrado especialmente porosas.
Quatro anos atrás, dez funcionários de uma fundição morreram com a explosão de granadas militares, aparentemente vindas do Irã, escondidas dentro de um contêiner de sucata metálica.
Em 2009, contêineres de aço indiano foram barrados em portos europeus, por conta de altos níveis de radiação. Fundições indianas haviam fabricado o aço em parte a partir de sucatas metálicas derretidas que, conforme foi revelado, estavam contaminadas por cobalto-60, o mesmo isótopo radiativo detectado no episódio de Mayapuri.
O cobalto-60 é comumente utilizado em máquinas de irradiação de alimentos e em radioterapia.
As autoridades indianas dizem que as diretrizes do país para a importação de sucata obedecem a padrões internacionais, mas que seu monitoramento é inadequado. Um plano do governo para instalar monitores de radiação em portos e aeroportos está com sua implementação atrasada. "Reconheço que nem tudo foi implementado ainda", disse o ministro Prithviraj Chavan a parlamentares.
Críticos afirmam que o governo reluta em endurecer os regulamentos ou o monitoramento porque a importação de sucata emprega grande número de trabalhadores e ajuda o país a atender a sua demanda por aço.
"O governo só tem agido com firmeza quando há uma crise ou um caso grave", disse Ravi Agarwal, fundador do grupo não governamental Toxics Link. "Ele não quer realmente acabar com esse negócio."
Didier Louvat, especialista em lixo nuclear junto à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), disse que o caso de Mayapuri é a instância global mais séria de exposição a radiação vista desde 2006.
Em fevereiro de 2009, a agência pediu a harmonização dos regulamentos relativos a materiais radiativos que aparecem em depósitos de ferro-velho, mas ainda não houve medidas concretas.
Cerca de 200 trabalhadores e donos de ferros-velhos em Mayapuri se reuniram em 22 de abril para orar pelas pessoas adoentadas -e para que a vida e os negócios voltem ao normal. "O que mais podemos fazer senão pedir ajuda a Deus?", disse Jaibhagwan Jain, dono de ferro-velho.


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