São Paulo, segunda-feira, 05 de julho de 2010

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Juntas, Rússia e China desbravam a Sibéria

Por ANDREW E. KRAMER

BIROBIDZHAN, Rússia - A mina de Kimkan é um lamacento buraco de 2,6 km2, cercado por intermináveis florestas de bétulas e cedros. Como em tantos lugares da Sibéria, é quase impossível chegar de carro ali. Mas logo abaixo da superfície, segundo geólogos russos, há minério de ferro suficiente para construir centenas de milhões de veículos.
Autoridades e empresas chinesas estão interessadas nisso, apesar de um legado de décadas de desconfiança nesse trecho da fronteira Rússia-China.
Neste ano, uma delegação do Banco Industrial e Comercial da China chegou de helicóptero a Kimkan para conversar com o encarregado da mina, Viktor Riabov, que explicou a dimensão das riquezas subterrâneas.
"Estou parado sobre 1 bilhão de toneladas de minério de ferro", disse Riabov aos visitantes. Ele lembra que os chineses se impressionaram. "Eles disseram: 'Apresse-se, estamos prontos'."
O encontro foi emblemático de um frenesi comercial nessa promissora região. Empresas russas disputam para assinar contratos para a venda de recursos siberianos -inclusive ferro, carvão e madeira- ao insaciável mercado chinês.
O petróleo russo também é uma matéria-prima cada vez mais cobiçada atravessando a Sibéria até a China.
Para a China, o abastecimento por terra de metais e de petróleo da Rússia é uma importante diversificação em relação ao transporte marítimo. O comércio transfronteiriço nessa região ajudou a China a superar a Alemanha e se tornar, no ano passado, o maior parceiro comercial da Rússia, com um fluxo de US$ 39,5 bilhões em bens e serviços em 2009.
No ano passado, o Extremo Oriente russo foi a única região da Rússia em que os investimentos cresceram. Como mais um sinal da interdependência Rússia-China, os presidentes dos dois países, Dmitri Medvedev e Hu Jintao, se encontraram em 10 de junho em Tachkent, no Uzbequistão, para uma conferência da sua aliança regional de segurança, a Organização da Cooperação de Xangai.
Tudo isso vem sacudindo a lúgubre reputação de lugares cujos nomes -Sibéria e Manchúria- no passado eram sinônimo de exílio, prisioneiros e pântanos intermináveis.
"Rússia e China forma um casal perfeito", escreveu Kingsmill Bond, estrategista-chefe do banco moscovita de investimentos Troika Dialog, em um relatório. "A Rússia tem recursos de que a China precisa, enquanto a Rússia necessita de capital, e a China tem poupança em excesso."
O banco chinês que mandou uma delegação à mina de Kimkan está em negociações avançadas para um empréstimo de US$ 400 milhões que permita à mineradora Petropavlovsk começar a extrair minério.
As reservas das quais Riabov falou estão em Kimkan e numa outra mina ao norte e precisariam de uns cem anos para serem exploradas. Só em 1987 Aleksandr Vinnikov, então dirigente comunista local, hoje governador da Região Autônoma Judaica, convenceu Moscou a permitir uma travessia de balsa numa aldeia à beira do rio Amur.
Vinnikov hoje defende com afinco uma ponte ferroviária sobre o Amur na aldeia de Nijneleninskoie, destinada principalmente ao transporte de minério de ferro de Kimkan para as usinas chinesas.
Mas o maior projeto atualmente em curso ali pode ser o oleoduto transiberiano, que está sendo instalado na taiga, a densa floresta da região, e está previsto para chegar à China em 2012, com um fluxo de 1 milhão de barris por dia.
Até lá, cerca de um quarto do petróleo russo será exportado para a Ásia, inclusive combustível de empreendimentos da Exxon Mobil e da Shell na ilha Sakhalina.
Para a China, o petróleo trazido por terra da Ásia Central -via um duto do Cazaquistão, e dentro de dois anos vindo da Rússia- serve para aprofundar uma meta política: a diversificação do abastecimento do petróleo, hoje fortemente dependente do Oriente Médio.
Empresas chinesas, enquanto isso, já arrendaram 343 mil hectares de terras agrícolas no Extremo Oriente da Rússia, que ficaram ociosas pelo encolhimento da população etnicamente russa, e estão estimulando migrantes chineses a fazer trabalhos sazonais ali. Do lado russo, o comércio com a China representa a promessa de uma nova era de prosperidade, em comparação com os modestos rendimentos da pesca, da agricultura e da indústria militar que vieram antes.
Aleksei Karskanov, que dirige uma mina de ouro operada pela Petropavlovsk perto da fronteira, chacoalhava num jipe por uma estrada de terra para mostrar esse gigantesco garimpo, que produz 4 toneladas de ouro por ano.
Ele compra maquinário chinês de mineração e contrata caminhoneiros chineses.
"A China é nossa vizinha", afirmou. "Se temos algo que nosso vizinho quer, por que não vender para ele?"


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