São Paulo, segunda-feira, 07 de dezembro de 2009

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Mestiçagem é desafio na Coreia do Sul

Cresce o número de bebês que vêm de famílias mistas

Por MARTIN FACKLER

YEONGGWANG, Coreia do Sul - Há poucos anos, o número de mulheres grávidas na cidade de Yeonggwang tinha diminuído tanto que a maternidade local, mal equipada e com apenas dois quartos, chegou perto de ser fechada. Mas o movimento voltou.
Mais surpreendente que o "baby boom" em miniatura é sua composição: crianças de origens étnicas mestiças, filhas de pais coreanos e mães vindas de China, Vietnã e outras regiões da Ásia. De repente, essas famílias se tornaram tão numerosas que as enfermeiras tiveram que aprender a dizer "empurre!" em quatro idiomas.
A história se repete em toda parte na Coreia do Sul, para onde migraram centenas de milhares de mulheres estrangeiras nos últimos anos, em muitos casos para casamentos arranjados por intermediários. Essas imigrantes têm compensado a escassez de sul-coreanas disponíveis, especialmente em áreas rurais subdesenvolvidas como Yeonggwang, no sudoeste do país.
Hoje, essas uniões têm resultado em grande número de crianças mestiças, levando esse país orgulhoso de sua homogeneidade a enfrentar o desafio difícil de absorvê-las tranquilamente.
A Coreia do Sul é, de modo geral, mais aberta à diversidade étnica que outros países asiáticos, como o Japão. Mesmo assim, ela está longe de abrir os braços a essas crianças, conhecidas pejorativamente ali como "Kosians", ou "cosiáticas" -coreanas e asiáticas.
"Trazemos estas crianças ao mundo, mas às vezes me preocupo", disse Kwak Ock-ja, enfermeira-chefe da maternidade de Yeonggwang, onde um terço dos 132 partos deste ano foi de crianças de origem mestiça. Há uma década, o fenômeno era quase desconhecido. "O preconceito contra essas famílias é algo que a sociedade terá de resolver", agregou.
O aumento dos nascimentos de mestiços é fruto do crescimento explosivo de casamentos com estrangeiras, à medida que o excesso de homens solteiros e a transferência de mulheres solteiras às cidades grandes, como Seul, têm levado os sul-coreanos de áreas rurais a buscar noivas em regiões mais pobres da Ásia.
Além disso, a preferência por bebês do sexo masculino ajudou a desequilibrar a população, de modo que há menos sul-coreanas disponíveis para o casamento. O Ministério da Segurança Pública diz que o total de filhos de famílias multiculturais na Coreia do Sul subiu de 58 mil em dezembro passado para 107,6 mil em maio deste ano, embora o órgão diga que pode ter errado o número para baixo em 2008.
Em paralelo, o índice geral de natalidade na Coreia do Sul caiu para 1,22 filho por mulher em idade reprodutiva, uma das taxas mais baixas do mundo. Ao mesmo tempo em que muitos sul-coreanos dizem esperar que o aumento das crianças mestiças possa ajudar a rejuvenescer sua sociedade em processo de envelhecimento, eles também temem que sua não assimilação possa criar a espécie de subclasse pobre e marginalizada de minorias étnicas vista em EUA e Europa.
"Nossa baixa taxa de natalidade está nos obrigando a entender que não podemos mais ser homogêneos", disse Park Hwa-seo, professor de estudos da migração na Universidade Myongji, em Seul. "Não é fácil, mas não há outra saída senão abrir os braços a essas famílias mais diversificadas."
Especialistas dizem que o maior risco para as crianças mestiças é que sejam marginalizadas em uma sociedade que só começou a enfrentar a questão da diversidade étnica quando a escassez de mão de obra obrigou a Coreia do Sul a receber trabalhadores estrangeiros, na década de 1990.
Essas preocupações estão presentes na cabeça de Vicky Merano, 29, que veio das Filipinas para Yeonggwang seis anos atrás para casar-se com um plantador de arroz sul-coreano 18 anos mais velho. A filha de cinco anos deles, Kim Da-som, sabe ler a escrita coreana e também vários caracteres chineses. Mas Merano teme o que possa acontecer quando Da-som passar da escola primária e diz torcer para que "as pessoas pensem que minha filha é coreana".


Colaborou com pesquisa Li Bibo


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