São Paulo, segunda-feira, 07 de dezembro de 2009

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NOSSA FORMA DE COMER

Caçadores novatos abatem seu jantar

Por SEAN PATRICK FARRELL

CHARLOTTESVILLE, Virgínia - O desejo de forjar vínculos mais profundos com os alimentos vem atraindo milhares de pessoas às feiras de produtores, levando ao cultivo de milhões de mudas em quintais e estimulando o interesse pela produção artesanal de pães e bolos por e outras atividades herdadas de tempos passados. Agora, a caça vem se somar a essa lista. Caçadores urbanos novatos estão criando clubes para aprender habilidades que, algumas gerações atrás, frequentemente eram transmitidas de pai para filho.
Em Charlottesville (EUA), o corretor de seguros Jackson Launders ensina caça ao cervo para os adeptos da alimentação de origem local. Landers, 31, começou as aulas neste ano para atender a adultos em sua maioria urbanos, que, como ele, não aprenderam a caçar na infância ou adolescência.
Ele discorre sobre a biologia, o habitat e a anatomia dos cervos, completando as aulas com visitas a um estande de tiro onde os alunos podem treinar tiro ao alvo e aprender a retalhar e cozinhar o corpo do animal.
"Eu nunca tinha usado uma arma antes", contou um dos alunos, o designer gráfico Michael Davis, 44. "Cresci no sul da Califórnia. A gente surfava. Não caçava."
Mas Davis disse que precisava compreender o significado de caçar para buscar seu próprio alimento. "Acho que passar por toda minha vida sem conhecer aquela experiência mais primordial, a caça, seria uma enganação", disse.
Foi o sabor da carne de javali selvagem que levou Nick Zigelbaum, 26, e Nick Chaset, 27, a formar a Sociedade de Caça Alce Americano, clube de caça e gastronomia de San Francisco. Fundada em 2007, a sociedade visa atrair jovens urbanos interessados em expandir seus horizontes.
Hoje, o clube tem cerca de 55 filiados pagantes, muitos na casa dos 20 ou 30 anos, que saem juntos para caçar javalis, faisões e aves aquáticas. Eles dividem no próprio campo o que conseguem abater.
O número de caçadores nos EUA vem caindo há décadas. A principal razão disso é a passagem da vida rural para a vida urbana, disse Mark Damian Duda, diretor-executivo da Responsive Management, empresa de pesquisas especializada em recursos naturais e lazer. Segundo pesquisas de sua firma, apenas 22% dos caçadores atuais dizem caçar principalmente pelo alimento. A maioria afirma que o faz como atividade recreativa. "Trinta anos atrás, mais ou menos metade dos caçadores caçava para se alimentar", disse Duda.
Anthony Licata, editor da revista "Field & Stream", disse não estar surpreso pelo fato de uma nova geração estar descobrindo algo que os caçadores tradicionais sempre souberam. "Não existe nada mais orgânico ou caipira que a carne que você mesmo abate para seu consumo", disse. "Quando você caça e tem a sorte de poder alimentar sua família, é uma coisa muito forte."
Landers, que procura abater o máximo de cervos permitidos na Virgínia por ano -seis-, concorda. Pelo custo das licenças necessárias, US$ 36,50, ele diz que pode estocar seu freezer com proteína quase gratuita.
Outro argumento dele para atrair pessoas conscientes dos problemas ambientais é que a caça é uma atividade praticamente neutra em termos de emissões de carbono. "Se você consegue abater um veado em seu quintal e destrinchá-lo ali mesmo, são zero quilômetros de transporte para aquele alimento", explicou.
Landers se interessou por caçar animais silvestres alguns anos atrás, quando herdou a espingarda de caça de seu bisavô. Ele estudou questões relacionadas à administração da população de cervos, procurou a ajuda de familiares, muitos dos quais caçadores, e em pouco tempo já estava colocando carne de cervo sobre a mesa.
Como muitas pessoas, ele se preocupava com os métodos empregados na pecuária em grande escala, como os antibióticos dados ao gado e as questões éticas ligadas à criação de animais confinados. Caçar lhe pareceu uma boa alternativa. "Eu me sentia mal por comer carne", explicou, "mas não tão mal que estivesse disposto a abrir mão dela".
Antes de fundar seu clube de caça, Zigelbaum e Chaset queriam ter uma ligação mais estreita com os alimentos que consumiam, mas não foi fácil encontrar informações sobre caça na Califórnia.
Chaset foi a uma loja de armas em San Francisco para procurar uma arma apropriada para caçar javalis selvagens. Os funcionários tentaram convencê-lo de que uma pistola serviria. Ele saiu levando o único rifle da loja e com ele abateu seu primeiro javali, experiência que descreveu como "uma epifania". "Tive uma sensação muito forte do ciclo da vida."
Zigelbaum contou que a carne de javali selvagem "é magra, mas tem sabor de bacon". Ele pretende viajar ao sul da França para estudar métodos tradicionais de produção de linguiças de porco. Um presunto de javali selvagem, disse, seria "fantástico".


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