São Paulo, segunda-feira, 08 de fevereiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Um novo tipo de jazz, cortesia dos robôs

Por NATE CHINEN
O guitarrista de jazz Pat Metheny passou recentemente um tempo incomum pensando em robôs. "Eu não durmo mais de quatro horas por noite há seis meses", ele disse no semestre passado, em um espaço de ensaios em Nova York.
Vestindo camiseta e jeans desbotados, Metheny estava diante de um muro de 4 m de altura e 10 m de largura, enfeitado com instrumentos musicais: uma imponente banda eletrônica de um homem só. O dispositivo ganhou vida em um redemoinho mecânico: baquetas tocando címbalos, controles deslizando sobre cordas, martelos caindo em cascata em um vibrafone.
Metheny fechou os olhos e se debruçou sobre sua guitarra, dando um toque humano a "Expansion", a peça principal de seu novo álbum, "Orchestrion" (gravadora Nonesuch). A melodia combinava aspectos do jazz pós-Coltrane com pop brasileiro e amplidão cinematográfica. Por isso, além do feito técnico óbvio -milhares de peças móveis executando uma partitura programada-, a apresentação surpreendeu em um nível básico.
"Isto é algo com que eu literalmente sonho desde meus nove anos", disse Metheny, 55, um dos músicos de jazz mais empreendedores de sua geração. Ele trabalhou em uma série de ambientes, de duplas folclóricas a trios de be-bop, até o grande Pat Metheny Group. Mas os robôs eram um novo elemento, e Metheny parecia ansioso para se explicar. Ele fez isso durante os preparativos para uma extensa turnê que começou no último dia 1? na França.
Metheny, que cresceu em Missouri (EUA), atribui sua paixão pela automação musical a um antigo piano mecânico que havia no porão da casa de seu avô. Mais tarde ele aprendeu sobre "orchestrions", as orquestras mecânicas movidas a ar que floresceram no século 19, antes do advento da gravação comercial. Embora impressionado pelos mecanismos, ele ficou surpreso com suas limitações musicais. "Aquilo me marcou como algo óbvio para se fazer. Fico meio incrédulo de que ninguém realmente tenha pensado nisso."
Foi cerca de cinco anos atrás que ele começou a sentir que a tecnologia de um "orchestrion" moderno estava ao alcance. Mark Herbert, seu antigo técnico de guitarra, tinha projetado um instrumento mecânico com solenóides, espécie de resistências que empregam energia eletromecânica em vez de pneumática.
O interesse de Metheny o levou a Eric Singer, engenheiro e músico do Brooklyn que fazia um trabalho semelhante com um grupo que chamava de Lemur (sigla em inglês para Liga de Robôs Urbanos Musicais Eletrônicos). Logo o Lemur recebeu a encomenda de construir uma orquestra. "Sendo Pat Metheny com sua visão grandiosa, ele queria uma de cada coisa", diz Singer.
Depois havia a música, parte da qual Metheny já tinha composto anteriormente.
"Nada funcionou", ele disse. "Não parecia bom, não soava bem." Então ele recomeçou. "Muito rapidamente tive de descobrir para que eles serviam", ele lembrou, referindo-se aos robôs. "O que eles podem fazer e o que não podem? E há muita coisa que não podem. Mas eu mais ou menos compus para suas capacidades."
Notavelmente, "Orchestrion", gravado em outubro, mostra poucos vestígios de um compromisso irregular.
"Entry Point", a primeira canção concluída, é um estudo de ondulação sutil. O único momento realmente estranho do disco ocorre em "Soul Search", durante um flerte com o suingue -que, afinal, não é um ponto forte dos robôs.
A experiência ao vivo de "Orchestrion" deverá superar a do disco, desde que a equipe de turnê de Metheny consiga mantê-la. "Prevejo que esta turnê será uma experiência de construção de caráter", disse Metheny.
Leif Krinkle, construtor de robôs da Lemur, estava inspecionando o equipamento ali perto, assim como David Oakes, o diretor técnico de Metheny há muitos anos, que vai dirigir a turnê. "Algumas dessas coisas não estão totalmente prontas", disse Oakes. Ele mostrou um mecanismo de entrada. "Isso dificilmente serve para a estrada: um dois por quatro com fios presos a ele. Para mim parece uma grande lista de coisas a fazer", acrescentou Oakes.
"Para mim também", concordou Metheny. Mas ele estava sorrindo.


Texto Anterior: Arte & Estilo
Ensaio - Dwight Garner: O buraco negro da Coreia do Norte

Próximo Texto: Internautas ganham papel ativo em museus on-line
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.