São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2010

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Toyota enfrenta hostilidade no Japão

Por MARTIN FACKLER

KARIYA, Japão - Depois de anos sentindo a dor do corte de custos na Toyota, alguns trabalhadores e fornecedores que costumavam ser seus maiores entusiastas experimentam uma sensação de prazer obscuro pelos problemas da companhia.
A sensação tem origem na mudança de comportamento das empresas japonesas. Comunidades como Kariya, que um dia gozaram de uma relação quase familiar com a Toyota, sentem-se abandonadas há anos, conforme o contrato social japonês mudava.
Embora o emprego ainda seja vitalício para os trabalhadores em tempo integral da Toyota, alguns se queixam de que a empresa hoje pratica aumentos salariais miseráveis, reduziu suas fileiras de contratados em curto prazo e pressionou os fornecedores a reduzir os preços.
Por décadas, milhares de companhias de peças para carros, como a Sankyo Seiko, foram leais à Toyota. Mas, nos últimos anos, as exigências da gigante automobilística por preços cada vez mais baixos levaram muitas dessas empresas à falência. Hoje a Toyota lhes paga cerca de 30% menos pela mesma peça que uma década atrás, apesar do custo mais alto de matérias-primas como o aço, dizem muitas empresas.
"A Toyota nos espreme como se tentasse tirar água de uma toalha seca", disse Masayuki Nishioka, 49, cuja fábrica em Kariya faz borrachas para veículos.
Em janeiro, o dono da Sankyo, Teruo Moewaki, apareceu na TV local para fazer o impensável: criticar a Toyota, anunciando que não aceitaria mais pedidos da montadora. "Eu disse o que todos querem dizer mas não têm coragem", disse Moewaki, 60. "A Toyota disse que éramos todos uma grande família. Mas agora está nos traindo."
Segundo muitos em Kariya, nos bons tempos a Toyota deixou de aumentar os salários dos funcionários e forçou cortes de preços dolorosos para os fornecedores de peças, mesmo enquanto obtinha lucros recordes. Desde a crise econômica, dizem esses críticos, a Toyota demitiu milhares de trabalhadores contratados e pressionou os fabricantes de peças.
A empresa tornou-se um símbolo de como o Japão corporativo começou a violar o contrato social assumido no pós-guerra, segundo o qual grandes companhias paternalistas compartilham sua riqueza nos bons e nos maus tempos.
"A Toyota é atacada porque se tornou a face do Japão corporativo", disse Hisao Inoue, autor de dois livros sobre a empresa. Ele disse que a crítica talvez seja injusta e faz parte de uma reação maior contra a globalização e a adoção da concorrência no estilo americano sob o ex-premiê Junichiro Koizumi.
Cidades como Kariya parecem se transformar em um novo cinturão da ferrugem, com bairros industriais abandonados, e economistas estimam que o número de pequenos fabricantes nessa parte do Japão caiu pela metade nos últimos 20 anos, para cerca de 180 mil. O desemprego também decolou na região de Nagoya, duplicando para 4,5% no ano passado em relação a 2008.
Um dos novos desempregados é Osamu Miura, que trabalhou durante dois anos em controle de qualidade em uma extensa fábrica de híbridos Prius em Toyota City, onde se situa a empresa. Dois meses atrás, a companhia disse que não renovaria seu contrato.
Mas, ao contrário da maioria, Miura se recusou a sair silenciosamente. Todos os dias ele se apresenta para trabalhar no portão da fábrica, onde é invariavelmente rejeitado. Em uma tarde chuvosa recente, meia dúzia de funcionários e ex-funcionários da Toyota, membros de um pequeno sindicato, uniram-se a ele para distribuir folhetos aos trabalhadores que passavam.
"A Toyota está indo na direção errada, e o Japão também", disse Miura, 40, que pendurou em seu peito uma placa azul que diz: "Deixem-me trabalhar!"


Colaborou Makiko Inoue, em Toyota City


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