São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Velha guarda de Wall Street quer restrições mais duras

"[As grandes casas mercantis] desfrutam de uma garantia implícita. Fingir que seriam deixadas à falência não é crível"
GEORGE SOROS
Investidor bilionário

Por LOUIS UCHITELLE

Deixe de lado por um momento a pressão pela regulamentação bancária e empresarial. Pergunte aos veteranos desses setores -gigantes como George Soros, Nicholas Brady, John Reed, William Donaldson e John Bogle- a opinião deles a respeito de regulamentação, e eles lhe surpreenderão com suas atitudes populistas.
Eles certamente não são parte do populacho irado. Enriqueceram muito com as finanças, em geral nas décadas de 1970 e 80, quando bancos e corretoras de valores eram consideravelmente mais regulamentados. E, hoje, afastando-se dos atuais senhores de Wall Street, eles querem mais regras.
Enquanto a geração mais jovem, muito visivelmente liderada por Lloyd Blankfein, executivo-chefe do Goldman Sachs, faz lobby no Congresso contra essa regulamentação, os anciões que são seus guias espirituais apoiam a reforma proposta por Paul Volcker, e alguns querem até mais restrições. "Sou um crente de que o sistema ficou terrivelmente errado e precisa de uma enorme reforma", disse Bogle, 80, fundador e por muitos anos executivo-chefe do grupo Vanguard, um enorme fundo.
Volcker, 82, arregimentou o apoio de quase uma dúzia de colegas com idade média acima dos 70 e cujos pedigrees em Wall Street e entre os bancos são impecáveis. Mas, enquanto Volcker enfatiza a regra que proibiria um banco que receba depósitos de também negociar títulos por conta própria -com risco de terem prejuízos-, a maioria dos seus proeminentes apoiadores vê isso como um ponto de partida para um retorno mais amplo à regulamentação. E a maioria não hesita em se deixar entrevistar.
Ouça Nicholas Brady, secretário do Tesouro no fim dos anos 80 e começo dos 90, e antes presidente da hoje extinta Dillon Read & Company, então prestigiada em Wall Street. "Se você é um banco comercial", disse, "e quer que o governo garanta seus depósitos e lhe resgate se necessário, não pode se envolver em atividade especulativa".
Quando foi copresidente do Citigroup, John Reed ajudou a transformá-lo em uma potência que misturava um banco comercial com todo tipo de atividade mercantil, o que ajudou a precipitar a atual crise do crédito, exigindo um custoso resgate federal para o Citigroup e outras empresas, em 2008.
Reed, 71, saíra muito antes da crise e, na aposentadoria, reconsiderou suas ideias. Ele agora fala até mesmo em ressuscitar a Lei Glass-Steagall, de 1933, que impedia os bancos de fazer qualquer atividade mercantil envolvendo títulos e ações. A lei foi revogada em 1999, em parte a pedido do Citigroup, então dirigido por Sanford Weill.
"Posso me convencer de que deveríamos voltar na direção da Glass-Steagall", disse ele, discordando de Weill, 76, para quem a desregulamentação foi o caminho correto. Numa parede do seu escritório de aposentado está pendurada uma das canetas que o ex-presidente dos EUA, Bill Clinton (1993-2001), usou para sancionar a lei que revogava a Glass-Steagall.
Reed, por sua vez, se pergunta se uma operação mercantil deveria realmente existir sob o mesmo teto que um banco comercial comum. Operadores ganham mais em salários e bônus que os funcionários bancários, e há atritos. "O pessoal dos bancos diz: 'Se os caras do mercado de capitais assumem riscos grandes, por que nós também não podemos assumi-los e ganhar alguns trocados?'", disse Reed. "Eles começam a tentar coisas que os fazem parecer bons, como oferecer empréstimos comerciais arriscados e se guiar pelo volume."
O bilionário operador George Soros se enquadra na categoria dos anciões que apoiam Volcker, a quem qualifica como "um extraordinário servidor público".
Mas só a Regra de Volcker não basta, disse Soros. Aos 79 anos, ele afirmou já ter visto o Goldman Sachs e outras firmas do gênero em Wall Street ficarem grandes demais para falirem, o que significa que nenhum governo poderia permitir que tais gigantes passassem pela ordeira liquidação de Volcker e desaparecessem. "É preciso reconhecer que eles desfrutam de uma garantia implícita", afirmou Soros sobre as grandes casas mercantis. "Fingir que seriam deixadas à falência não é crível."
A solução, para Soros, é evitar a falência. Uma grande firma em Wall Street "teria de ser atentamente regulamentada para assegurar que não vá à falência".
Contratos de derivativos são uma fonte de risco, e Soros limitaria seu uso. Esses contratos ainda são onipresentes. Quando vencem em grandes quantidades, como ocorreria em 2008, há um contágio que abala uma instituição financeira após outra.
Isso preocupa William Donaldson, presidente da SEC (Comissão de Títulos e Câmbio) no governo de George W. Bush e cofundador da Donaldson, Lufkin & Jenrette, empresa que chegou a ter papel proeminente em Wall Street.
Para lidar com isso, Donaldson, 78, sugere que o Congresso crie uma poderosa agência reguladora, independente do Fed (Banco Central) e de órgãos públicos, cujos membros seriam nomeados pelo presidente. "A 'Regra de Volcker' e a iniciativa de Volcker estão levando a discussão sobre a regulamentação a um novo nível", disse.


Texto Anterior: Toyota enfrenta hostilidade no Japão
Próximo Texto: Educação
Ensino superior haitiano vive vácuo no pós-tremor

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.