São Paulo, segunda-feira, 08 de junho de 2009

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Retórica presidencial mira inimigos, sejam reais ou imaginários

Por HELENE COOPER

WASHINGTON — Os democratas se queixavam muitas vezes do uso frequente feito pelo então presidente dos EUA, George W. Bush, de um antigo artifício de retórica: criar a ilusão de estar refutando o argumento de um adversário, caracterizando o argumento erroneamente e então atacando o argumento descaracterizado. É algo conhecido comumente como derrubar homens de palha.
Houve reações de ultraje, por exemplo, em 2006, quando Bush disse que, quando se tratava de combater terroristas, “preciso que o Congresso entenda que não é possível negociar com essa gente” —deixando implícito que os democratas seriam favoráveis a negociações com a Al Qaeda.
Agora que há uma equipe nova na Casa Branca, adivinhe quem anda derrubando homens de palha a torto e direito? Ouvindo o presidente Barack Obama, dir-se-ia que Washington foi invadida por um verdadeiro exército de negadores.
“Há quem diga que esses planos são ambiciosos demais —que deveríamos estar tentando fazer menos, e não mais”, disse Obama numa reunião pública em estilo informal na Califórnia, em 18 de março. “Bem, eu afirmo que nossos desafios são grandes demais para serem ignorados.”
Obama não especificou quem estaria dizendo que os EUA deveriam ignorar os desafios que tem pela frente.
De maneira semelhante, no dia seguinte, em Los Angeles, Obama mirou contra Wall Street e Washington, dois de seus homens de palha favoritos. “Sei que algumas pessoas em Washington e Wall Street estão dizendo que deveríamos focar apenas os problemas delas”, disse Obama. “Seria agradável se eu pudesse simplesmente selecionar quais problemas enfrentar e quando. Então eu poderia dizer ‘não quero lidar com a guerra no Afeganistão agora; prefiro não precisar lidar com as mudanças climáticas neste momento. E segurem firme, por favor, mesmo que não tenham atendimento de saúde —esperem, por favor, porque tenho outras coisas a fazer’.”
Os sinais que traem a chegada iminente de um truque com homem de palha são as palavras introdutórias “há quem diga” ou “há pessoas que dizem”.
“Eis o truque: leve o argumento de seu adversário até um extremo ridículo e então ataque os extremistas”, disse William Safire, ex-redator de discursos presidenciais que escreve a coluna “Sobre Linguagem” na “New York Times Magazine”. “O adversário é reduzido a ter que defender-se, dizendo ‘mas eu nunca falei isso!’.”
Em sua primeira viagem ao exterior, Obama derrubou um alvo depois de outro, em sucessão rápida, para o benefício de estudantes em Istambul. “Algumas pessoas dizem que talvez eu esteja sendo idealista demais”, falou. “Fiz um discurso em Praga falando sobre a redução e eliminação final das armas nucleares, e algumas pessoas disseram ‘oh, mas isso jamais vai acontecer’. (...) Ou ‘por que está fazendo um gesto em direção aos iranianos, já que EUA e Irã nunca concordam em nada?’.”
Depois disso, quem não aplaudiria a derrubada de tanto pessimismo?
Assessores de Obama dizem que o grau em que ele usa homens de palha não chega perto do que é feito pelo ex-vice-presidente Dick Cheney. De fato, Cheney recentemente disparou o seguinte: “Pessoas que constantemente distorcem a verdade dessa maneira não estão em posição de pregar sermões sobre valores a ninguém”.


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