São Paulo, segunda-feira, 08 de dezembro de 2008 |
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INTELIGÊNCIA É preciso fugir da mentalidade da manada ROGER COHEN
Nova York
Tais espaços vazios, a salvo do marketing e de toda forma de mensagem (e-mail, texto, Twitter), se esvaem no mundo moderno, a ponto de que o silêncio provoque uma ansiedade do tipo “por que ninguém me procura?”. A tecnologia induz a uma dependência cada vez mais sutil não só em relação a produtos, mas à própria agitação. De certa forma, a atual crise global tem a ver com a dependência —em relação a instrumentos financeiros cada vez mais sofisticados e opacos feitos para empenhar tudo, de casas a contas de Previdência, em nome da remuneração elevada que alimentou o frenético consumo americano nos últimos anos. Tal frenesi encontrou uma terrível expressão durante o feriado de Ação de Graças, época de grandes promoções no varejo. Uma multidão foi a uma loja do Wal-Mart em Long Island (Nova York) atrás de ofertas de TVs e aparelhos de DVDs e ainda de madrugada invadiu o local e pisoteou um funcionário temporário, Jdimypai (“Jimbo”) Damour, 34, que morreu. Imagine a cena: 2.000 consumidores irritados depois de uma noite em claro, prensados contra as portas de vidro da loja e finalmente arrombando-as um pouco antes das 5h e pisoteando um homem agonizante, tudo para conseguir uma pechincha fugaz. Não estou advogando uma solução cubana —a maioria das lojas em Havana está vazia. Mas a morte de Damour parece ser o epitáfio para um surto de tolice nos EUA, o último espasmo do monstro que provocou uma dívida tão avassaladora que fez com que as casas de muitos americanos valham menos do que o saldo devedor deles no banco. O presidente eleito Barack Obama montou uma equipe econômica forte e experiente. Um pacote de estímulo com enormes gastos públicos pode ser um dos primeiros atos do seu governo. Mas antevejo uma longa recessão. Os americanos precisam reaprender a poupar e repensar suas prioridades. A parcimônia não ajudará a economia, mas pode ajudar na distinção entre humanos planos e TVs planas. Nada é mais letal que a manada. Foi um pensamento de manada, que não distinguiu entre reguladores e regulados, que zerou o custo do risco e deixou de joelhos alguns dos grandes nomes do sistema bancário dos EUA. No Wal-Mart, a mentalidade de manada fez com que a morte de um homem fosse invisível à multidão. Olhar e pensar de forma independente exige espaço visual. Mesmo que Havana esteja inacessível, recolha-se por um momento. Desligue os aparelhos, as TVs, os dispositivos portáteis. Respire fundo. Agora, em silêncio, veja se consegue imaginar o que Damour via na hora em que a turba ensandecida avançava sobre ele. Envie seu comentário a intelligence@nytimes.com
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