São Paulo, segunda-feira, 09 de novembro de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Pacifismo alemão enfrenta dura realidade no Afeganistão

Por NICHOLAS KULISH

KUNDUZ, Afeganistão - Obrigado a enfrentar a crescente insurgência no outrora pacífico norte do Afeganistão, o Exército alemão tem se engajado em um constante e sangrento combate em terra, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial.
Estão em jogo por quanto tempo a oposição na Alemanha vai permitir que suas tropas combatam e se elas terão margem de manobra em suas estritas regras de envolvimento para assumir o tipo de contrainsurgência que é defendido pelos generais americanos. A questão agora é se os americanos vão acabar lutando um tipo de guerra, e seus aliados, outro.
Depois da Segunda Guerra, a sociedade alemã recusou o uso do poder militar para qualquer coisa que não fosse a autodefesa, e o pacifismo é um grito de mobilização há gerações.
Os líderes alemães burlaram as proscrições nos últimos anos, especialmente participando de ataques aéreos na guerra em Kosovo. Ainda assim, o legado da proibição ao combate permanece na forma de regras estritas de envolvimento e em uma mentalidade de "atirar por último" que está causando tensões significativas com os Estados Unidos no Afeganistão.
Impelidos pela necessidade, alguns dos 4.250 soldados alemães ali, o terceiro maior número de tropas no contingente da Otan (aliança militar ocidental), já percorreram um longo caminho. Em 20 de outubro, eles distribuíram cobertores, bolas de vôlei e lanternas em um gesto de boa vontade para os moradores da aldeia de Yanghareq, 35 km a noroeste de Kunduz. Menos de uma hora depois, rebeldes com metralhadoras e granadas disparadas por foguetes emboscaram outros membros da mesma companhia.
Os alemães revidaram, matando um dos atacantes, antes que a poeira e a desordem tornassem impossível distinguir os militantes em fuga dos civis.
"Eles atiraram contra nós, e nós revidamos", disse o sargento Erik S., que, segundo as regras militares alemãs, não pode ser totalmente identificado.
"Pessoas vão cair dos dois lados. É simples assim. É a guerra." E acrescentou: "A palavra 'guerra' está se tornando mais forte na sociedade, e os políticos não podem mais mantê-la em segredo".
De fato, os políticos alemães se recusaram a pronunciá-la, tentando retratar a missão no Afeganistão como uma mistura de manutenção de paz e reconstrução, em apoio ao governo afegão. Mas sua linha se tornou menos sustentável conforme a insurgência se expandiu rapidamente no oeste e norte do país, onde a Alemanha lidera o comando regional e fornece a maioria das tropas.
Em parte, dizem oficiais da Otan e alemães, isto é uma evidência da astúcia política do Taleban e da Al Qaeda, que estão conscientes da oposição à guerra na Alemanha. Eles esperam explorá-la e forçar a retirada dos soldados alemães - dividindo a aliança da Otan- por meio de ataques a pessoal alemão no Afeganistão e de ameaças por vídeo e áudio de atentados terroristas na frente doméstica.
O general Stanley McChrystal, principal comandante americano no Afeganistão, está pressionando os aliados da Otan para contribuir com mais tropas para o esforço de guerra, mesmo enquanto países como Holanda e Canadá começam a discutir planos de retirada. A Alemanha resistiu aos pedidos de tropas adicionais até agora.
Os laços entre a Alemanha e os EUA foram tensionados em setembro por causa do bombardeio, ordenado por alemães, a dois caminhões-tanques sequestrados, que matou civis e insurgentes. Muitos alemães, desde altos políticos até os recrutas, acharam que McChrystal foi rápido demais em condenar o ataque, antes de uma investigação completa.
Soldados da Terceira Companhia, 391? Batalhão de Infantaria Mecanizada, disseram que faltam homens para a cada vez mais complexa missão afegã. Dois membros da companhia foram mortos em junho, entre 36 soldados alemães que morreram no Afeganistão.
Os soldados manifestaram frustração sobre a condenação ao ataque aéreo não apenas pelos aliados, mas também por seus próprios políticos e pela ausência de apoio em seu país. Os soldados alemães geralmente ficam no Afeganistão apenas quatro meses. O mandato também limita o número de tropas no país a 4.500.
Uma autoridade da Otan que pediu anonimato disse que o mandato é "uma camisa de força política".
Uma companhia de paraquedistas alemães no distrito de Chahar Darreh, onde a atividade insurgente é especialmente pronunciada, combateu uma série de ataques e ficou na área durante oito dias e sete noites.
"Quanto mais tempo ficamos lá, melhor a população local reagiu a nós", disse o capitão Thomas K. Outra companhia os substituiu durante três dias, mas então abandonou a posição, onde a inteligência disse que uma bomba esperava o próximo grupo de soldados alemães. "Desde que estivemos lá nenhuma outra companhia voltou", disse o comandante.


Colaborou Stefan Pauly, em Berlim


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