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Molécula da motivação dá garra ao cérebro
Visão atual sobre dopamina pode estar equivocada
NATALIE ANGIER
ENSAIO
Se você alguma vez já encontrou roedores devorando alimentos em sua cozinha, vai
gostar de conhecer uma variedade de camundongo de laboratório à qual falta a
motivação para comer.
O camundongo é fisicamente capaz de comer. Ele gosta do sabor da comida. Ele é
capaz de mastigar e engolir, ao mesmo tempo em que mexe o focinho em aparente
satisfação.
No entanto, se ficar por conta própria, ele não se animará a procurar seu
jantar. A simples ideia de ter que atravessar sua gaiola e tirar a ração da
tigela o enche de apatia avassaladora. Em poucas semanas, o bichinho morre de
inanição.
Por trás do tédio do roedor está um deficit grave de dopamina, uma das moléculas
de sinalização essenciais do cérebro. Ultimamente a dopamina tem estado na moda,
assim como esteve a serotonina nos anos 1990, com o Prozac.
As pessoas falam em receber sua "injeção de dopamina" com chocolate, música, a
Bolsa de Valores, a vibração do BlackBerry contra sua coxa -qualquer coisa que
lhes dê uma pequena sensação prazerosa. Sabe-se que agentes de dependência já
conhecidos, como cocaína, metanfetamina, álcool e nicotina, estimulam os
circuitos de dopamina do cérebro.
Na imaginação popular, a dopamina nos faz sentir bem e querer sentir bem outra
vez. Se você não se cuidar, ficará viciado, escravo das linhas de prazer que
percorrem seu cérebro.
Entretanto, como revelam novas pesquisas sobre camundongos deficientes em
dopamina e outros estudos, a imagem da dopamina como nosso pequeno Baco cerebral
é enganosa, assim como era enganosa a caricatura anterior da serotonina como um
"rostinho feliz" neural.
Segundo a visão emergente, discutida recentemente em Chicago em reunião da
Sociedade de Neurociência dos EUA, a dopamina diz respeito não tanto ao prazer e
à recompensa quanto à motivação e à garra, a enxergar o que é preciso fazer para
sobreviver e então fazê-lo. "Quando você não consegue respirar e está ofegante,
você diria que isso é prazeroso?", disse Nora D. Volkow, pesquisadora dos
efeitos da dopamina e diretora do Instituto Nacional de Abuso de Drogas. "Ou,
quando você está com tanta fome que se dispõe a comer algo asqueroso, isso é
prazeroso?"
Nessas duas reações, disse Volkow -quando você se esforça desesperadamente para
inspirar e quando come algo que normalmente rejeitaria-, os caminhos da dopamina
no cérebro estão funcionando a todo vapor. "O cérebro inteiro fica voltado a uma
só coisa", disse ela. "Esse ímpeto intenso é para tirar você de um estado de
privação e mantê-lo vivo."
A dopamina também faz parte do filtro de saliência do cérebro. "Não é possível
prestar atenção a tudo, mas você, como organismo, quer ser hábil em reconhecer
coisas novas", disse Volkow. "Você pode não notar uma mosca na sala, mas, se
essa mosca fosse fluorescente, suas células de dopamina entrariam em plena
ação."
Além disso, nosso detector de saliência movido a dopamina foca objetos
familiares que imbuímos de grande valor, tanto positivo quanto negativo: objetos
que desejamos e objetos que tememos. Se adoramos chocolate, nossos neurônios de
dopamina provavelmente começarão a disparar ao ver um bombonzinho sobre um
balcão. Mas, se temos medo de barata, os mesmos neurônios podem disparar ainda
mais quando percebemos que o suposto bombom na realidade tem seis patinhas.
Contudo, o próprio sabor prazeroso do chocolate ou a ansiedade provocada pela
fobia de baratas podem muito bem ser obra de outras moléculas de sinalização,
como opiáceos ou hormônios do estresse. A dopamina simplesmente faz com que seja
quase impossível ignorar um objeto relevante.
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