São Paulo, segunda-feira, 11 de maio de 2009

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Ex-espião tenta diálogo com islâmicos

Por ROBERT F. WORTH

BEIRUTE, Líbano - Conversar com os islâmicos é a nova ordem do dia em Washington e em Londres. O governo do presidente Barack Obama quer um diálogo com o Irã, e o Ministério das Relações Exteriores britânico decidiu retomar os contatos diplomáticos com o Hizbollah, grupo militante xiita baseado no Líbano.
No entanto, durante vários anos, pequenos grupos de diplomatas ocidentais fizeram viagens discretas a Beirute para sessões confidenciais com membros do Hamas, do Hizbollah e de outros grupos islâmicos com os quais não queriam ser vistos conversando. Em salas de conferência de hotéis, eles se trocavam desconfiados apertos de mãos, depois passavam horas escutando e fazendo acusações de terrorismo de um lado e de arrogância imperial do outro.
O organizador desses encontros é Alastair Crooke, homem de 59 anos, aparência tranquila e cabelos claros, que passou três décadas trabalhando para o MI6, o serviço secreto britânico. Hoje ele dirige no Líbano uma organização chamada Conflicts Forum (Fórum de Conflitos), com um quadro incomum de assessores que inclui antigos espiões, diplomatas e militantes pela paz.
Crooke passou grande parte de sua carreira conversando com islâmicos. Na década de 1980, em plena Guerra Fria, como um jovem agente secreto no Paquistão e no Afeganistão, ele ajudou a canalizar armas para os jihadistas que combatiam os soviéticos. Depois disso, passou anos trabalhando com o Hamas e o Fatah, no papel de negociador para a União Europeia, e ajudou a mediar vários cessar-fogos com Israel entre 2001 e 2003. Crooke conquistou uma reputação de coragem e tenacidade, mas pessoalmente é extremamente educado e gentil.
A missão do Conflicts Forum, que Crooke fundou em 2004, parece uma espécie de projeto dos atuais esforços do governo Obama: "Abrir um novo relacionamento entre o Ocidente e o mundo muçulmano".
Mas Crooke, que é conhecido por sua profunda rede de contatos entre grupos islâmicos em todo o Oriente Médio, não está otimista sobre as perspectivas de um simples diálogo, especialmente com o Irã.
"Acho que existe um medo verdadeiro de que haja um processo de negociações impositivo", ele disse. "Os iranianos vão dizer: 'Queremos falar sobre justiça e respeito'. Os Estados Unidos vão dizer: 'Vocês estão dispostos a desistir do enriquecimento [de urânio] ou não?'".
Para superar esse impasse com o Irã, e com os grupos islâmicos em geral, o Ocidente terá de modificar sua linguagem diplomática de ameaças e recompensas, disse Crooke, e demonstrar mais respeito pela opinião de seus adversários.
Crooke passou os últimos anos tentando explicar isso para ocidentais desconfiados, em uma série de artigos, palestras e conferências. Embora não seja um arabista por formação, ele desenvolveu um profundo conhecimento dos movimentos islâmicos modernos e discorre com facilidade sobre política palestina ou mesmo filosofia islâmica medieval.
Recentemente, levou seus esforços exploratórios um pouco além. Em um novo livro, "Resistance: the Essence of the Islamist Revolution" (Resistência: a essência da revolução islamista), ele evita deliberadamente os temas mais polêmicos, como Israel e a situação das mulheres no mundo islâmico.
Em vez disso, se concentra no que chama de núcleo da revolução islâmica, que define como uma resistência metafísica à definição ocidental do indivíduo e da sociedade, baseada no mercado. "Pareceu-me que havia uma verdadeira necessidade de compreender melhor o que acontecia dentro do islamismo, de valorizar o que eles diziam de uma maneira que pudesse ser compreendida no Ocidente", ele disse.


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