São Paulo, segunda-feira, 12 de abril de 2010

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ENSAIO

PETER BAKER


Obama aproveita o legado de Clinton

WASHINGTON - Durante anos, Bill Clinton tentou negociar um tratado de controle de armas para a era pós-Guerra Fria. Ele e Boris Ieltsin chegaram a concordar sobre um quadro geral para um novo tratado em Helsinque, mas ele nunca se concretizou. Por isso, o novo tratado Start, de redução de armas nucleares, que Barack Obama negociou com a Rússia vai realizar a antiga aspiração de Clinton.
Nove anos depois de Clinton ter deixado o cargo, Obama, de certa maneira, apanhou o bastão de seu antecessor democrata. Embora eles sejam presidentes muito diferentes e não tenham proximidade pessoal, pelo menos parte dos itens da agenda inacabada deixados pelo governo Clinton (1993-2001) encontraram lugar no topo da lista de prioridades de Obama. E o 44? presidente pode estar aproveitando o trabalho, e encarando os reveses, do 42? presidente.
O tratado e a reforma da assistência à saúde são os exemplos mais evidentes. Mas Obama também promoveu um pacote de estímulo econômico no ano passado que Clinton tentou, sem sucesso, fazer em seu primeiro ano. Obama atraiu o apoio bipartidário para suspender a proibição a homens e mulheres homossexuais de trabalhar abertamente no serviço militar, uma ideia que falhou com Clinton.
E, enquanto Clinton nunca submeteu o tratado de Kyoto a um Senado hostil, Obama está apresentando uma legislação sobre a mudança climática que tem a possibilidade de ser aprovada.
Outros presidentes aproveitaram a agenda política de seus antecessores. George W. Bush modelou sua Presidência como uma extensão da de Ronald Reagan (1981-89), especialmente no corte de impostos. E Franklin D. Roosevelt (1933-45) completou o legado de Woodrow Wilson (1913-21), especialmente na construção de uma organização internacional duradoura com a participação americana.
"Toda grande era progressista, se você examinar a história, começa com alguém atingindo as barricadas primeiro e outra pessoa estabelecendo aquela agenda e coalizão progressistas", disse Rahm Emanuel, chefe de gabinete de Obama (equivalente no Brasil a ministro-chefe da Casa Civil).
Esse foi o caso da assistência à saúde, 16 anos depois que a iniciativa de Clinton desmoronou, ele disse. "Sem que 94 criasse um certo espaço e certo conhecimento, a verdade é que 2010 não poderia ter acontecido."
É claro que as comparações são imprecisas, e as épocas em que os dois governaram são muito diferentes. Na calmaria depois da Guerra Fria, Clinton tentou puxar seu partido de volta ao centro político após anos em território selvagem, enquanto Obama fez campanha como uma figura mais progressista numa época de guerra, terrorismo e crise econômica.
E há áreas em que a agenda de Clinton não precisa de continuação. O sucesso dele em promover políticas de livre comércio e aplicar uma abordagem mais dura ao crime possivelmente tiraram essas questões da mesa para Obama.
"O problema de Clinton foi tentar mudar o sistema em uma época de paz e prosperidade", disse H. W. Brands, historiador presidencial que escreveu livros sobre Wilson e Roosevelt. "Os americanos são amigos do status quo; se não está quebrado, não conserte. A oportunidade de Obama foi chegar quando o status quo estava abalado e, na visão de muitos, desacreditado."
Ainda assim, os republicanos estão confiantes em que Obama aprendeu as lições erradas de Clinton e que, em última instância, ele verá seu partido sofrer nas urnas também. "Certamente ele alcançou um sucesso legislativo que Clinton não conseguiu, e isso lhe deu confiança e momento", disse Robert Walker, ex-deputado republicano da Pensilvânia.
"Mas o problema deles [democratas] é que o único momento é com sua própria base. Para os independentes, as verdadeiras questões são a dívida e o deficit. E alguns dos programas que [Obama] está implementando estão exacerbando o problema."
O perigo, naturalmente, é se basear demais na experiência de Clinton. "É preciso cuidado para não acreditar demais nas antigas lições", disse Joel P. Johnson, ex-assessor de Clinton. "Os tempos e as circunstâncias mudaram drasticamente.
Mas alguns fundamentos permanecem os mesmos, e os antigos erros fornecem percepções atuais. É mais ou menos o equivalente a estudar gravações de antigos jogos de futebol."


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