São Paulo, segunda-feira, 12 de julho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tráfico de patas de ursos prospera em divisa russa

Por ANDREW E. KRAMER

BLAGOVESCHENSK, Rússia - Fechada durante décadas, a fronteira entre Rússia e China vem se abrindo nos últimos anos, permitindo mais comércio e viagens, mas também um peculiar empreendimento internacional criminoso de partes de animais, para a medicina e a culinária chinesas.
"A coisa está generalizada neste momento", disse Aleksei L. Vaisman, da Traffic Europe-Russia (grupo patrocinado pela ONG WWF que monitora o comércio de animais selvagens), sobre o tráfico ilegal de partes de animais no Extremo Oriente.
Bexigas de urso -altamente valorizadas por suas qualidades medicinais e afrodisíacas- sapos, ossos de tigre, almíscar de cervo e órgãos genitais de veado malhado são contrabandeados diariamente para a China.
Mas as patas de ursos, um prato ritual dos chineses, são as mercadorias mais comuns nesse mercado subterrâneo, disse Vaisman. Ele estima que milhares delas sejam contrabandeadas por ano.
Embora ilegal, e talvez para a maioria das pessoas ofensivo, o tráfico aparentemente não ameaça a robusta população siberiana de ursos pardos, espécie parente do urso cinzento, que está crescendo apesar do comércio de patas.
O verdadeiro problema desse tráfico, segundo as autoridades, é que ele cria canais de contrabando para outras duas espécies que estão altamente ameaçadas, o tigre de Amur e o leopardo do Extremo Oriente. Os especialistas calculam a população de tigres de Amur em 450, com cerca de 30 mortos por caçadores ilegais anualmente. E somente cerca de 40 leopardos continuam na natureza.
Esses canais estão ficando mais movimentados a cada ano, dizem os especialistas. Escondidas sob ferro-velho em caminhões, puxadas sobre o rio Amur congelado no inverno ou escondidas entre roupas em malas carregadas por contrabandistas, as patas de urso conseguem chegar à China apesar dos esforços das autoridades russas.
Em 8 de fevereiro passado, agentes da patrulha de fronteiras da Rússia pararam dois caminhões que transportavam 447 patas de ursos na aldeia de Leninskoye, a poucos quilômetros da fronteira chinesa, e detiveram dois russos e um chinês.
Em Blagoveschensk, não é difícil encontrar patas de urso à venda; uma pergunta casual em um açougue pode fazer a conexão. Este, é claro, não é onde está o verdadeiro lucro. "Ligue para esse número na parede", diz uma vendedora, apontando para um quadro de avisos.
Logo depois, no interior obscuro de um veículo esportivo-utilitário, se faz um negócio. "Olá, Volodya, você tem alguma pata?", diz um intermediário em seu celular. "Eu tenho um sujeito que quer patas." Sem sorte.
"Sasha, você tem patas?", ele pergunta a outra fonte. "Não, alguém quer só ver." Uma pausa. "Ótimo, vamos até aí amanhã."
O encontro é marcado em um prédio deteriorado junto de uma estrada nos arredores de Blagoveschensk. O caçador entra em uma sala nos fundos, abre um congelador e revela os produtos: quatro patas congeladas.
Elas vêm de ursos que são mortos legalmente por caçadores e também por contrabandistas. No entanto, como a exportação de patas é ilegal, todo o comércio está proibido, disse o ministro dos Recursos Naturais da região de Amur, Yuri N. Privalov. Ele admite que o comércio ilícito prospera do mesmo modo.
"Um homem não tem nada para fazer na aldeia", explicou Oleg Lezin, dono de uma oficina de taxidermia em Blagoveschensk. "Ele pega um cachorro e persegue um urso na floresta, o mata e corta suas patas. Pode vendê-las por 1.500 rublos [R$ 85] o quilo. Depois ele vem para a cidade, compra bebida e fica bem até o próximo urso."
Alguns anos atrás, segundo Roman A. Chikachov, guarda-caça em Blagoveschensk, os caçadores russos começaram a contrabandear bexigas de javalis selvagens, mais comuns, como se fossem de urso. Quando descobriram o esquema, os compradores chineses, já desconfiados, tornaram-se mais cautelosos nos negócios.
Os russos ainda estão se perguntando como os chineses conseguiram identificar a diferença, disse Chikachov.


Texto Anterior: Academia busca ideias lucrativas
Próximo Texto: Nova onda tecnológica agiliza e barateia acesso a dados na internet
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.