São Paulo, segunda-feira, 13 de junho de 2011

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Chorar não tem vez nos funerais ganenses

Por SAM DOLNICK
Os irlandeses podem ser conhecidos por seus velórios animados, mas os ganenses aperfeiçoaram o funeral extravagante. E, em Nova York, essas festas são momentos importantes no calendário social da comunidade rapidamente crescente de imigrantes desse país da África ocidental.
Promovidos todo fim de semana, os funerais ganenses são festas que duram a noite inteira, com open bar e música de sacudir as janelas. Enquanto as famílias levantam dinheiro para cobrir as despesas dos funerais, DJs, fotógrafos, barmen e seguranças têm lucros garantidos.
Pode ou não haver um corpo presente, além de um clérigo. O morto pode ter morrido em Nova York ou na África, alguns dias ou alguns meses antes. Mas todos os funerais têm a mesma finalidade: são eventos festivos de levantamento de fundos para as famílias que perderam seus entes queridos e oferecem uma oportunidade para os ganenses dançarem para esquecer a dificuldade da vida de imigrantes.
"Para nós, o funeral é celebração", disse o mecânico de aviões Manny Tamakloe, 27, gritando para se fazer ouvir em meio à música do funeral de Gertrude Manye Ikol, uma enfermeira de 65 anos. Poucas festas ganenses se comparam à escala e ao nível de decibéis dessa cerimônia. Quando Kojo Ampah, 34, não tem planos para o fim de semana, ele telefona para outros imigrantes ganenses e pergunta "ei, tem funeral rolando?"
As festas memoriais vêm ficando maiores e mais frequentes, acompanhando o crescimento da população ganense de NY. As estimativas mais recentes do censo indicam que há cerca de 21 mil ganenses vivendo na cidade, em sua maioria no Bronx. Em 2005, havia 14 mil.
As festas são aguardadas com ansiedade, divulgadas com anúncios on-line ou filipetas distribuídas em comércios africanos. As filipetas mostram fotos da família e dos amigos.
Um funeral que atrai muitos convidados carrega grande prestígio social. Em uma noite de domingo em que Tamakloe já havia frequentado dois, ele falou sobre o funeral de um desconhecido, que seria realizado em breve. "Estão dizendo que vai ser o melhor funeral do ano", comentou.
O engenheiro Henry Boateng passou meses planejando o funeral do pai, que morreu em julho passado. Ele previa receber 300 convidados. Em Gana, os funerais são extravagantes. Os féretros podem parecer carros alegóricos do Carnaval de Nova Orleans; o de um atleta pode ter o formato de bola de futebol, o de um pescador, de canoa.
Como em Gana, os convidados que vão a funerais em NY não precisam ter conhecido o morto, nem mesmo sua família. Mas espera-se que doem entre US$ 50 e US$ 100 -embora muitos não o façam- para ajudar a cobrir os custos. Uma festa pode levantar milhares de dólares.
Os funerais movimentam uma economia. Henry Ayensu, dono de uma gráfica no Bronx, contou que, nos últimos dois meses, imprimiu filipetas para 12 funerais ganenses. Seis fotógrafos trabalharam no funeral de Gertrude Ikol, cada um deles acompanhado por um assistente. Eles venderam fotos por entre US$ 10 e US$ 20 cada uma.
Os funerais são eventos que rendem tanto dinheiro que as justificativas para sua realização, às vezes, são tênues, disse Ampah. Um residente em Nova York pode promover uma festa para o marido da sobrinha do primo, mesmo que nunca tenha conhecido o morto, e que poucos dos lucros acabem, de fato, chegando à família. Ampah contou que um taxista que ele conhece ganhou US$ 6.000 com um evento desse tipo. "As pessoas não hesitam em lhe pagar bem, pois ficam felizes em comparecer ao funeral." Os funerais começam por volta das dez horas da noite com bênçãos, cerimônias e discursos. Por volta da meia-noite, as pessoas começam a dançar. Às duas horas da manhã, a festa está embalada.
No recinto, o mestre de cerimônias louvava as qualidades de Ikol. O ambiente vibrava ao som do "highlife", uma fusão ganense de jazz, música de bandas de metais e ritmos africanos.
Francis Insaidoo, bioquímico que se mudou para Nova York recentemente, comentou sobre o funeral: "Você tem a sensação de não estar sozinho". Ele não conheceu Gertrude Ikol, mas seu colega de quarto, sim. Mas, então, o colega de quarto admitiu que não a conhecera. "A gente vem para curtir a festa", disse Insaidoo.


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