São Paulo, segunda-feira, 14 de março de 2011

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Era digital ameaça anotações feitas nas margens dos livros

De Darwin a Mandela, a ânsia de anotar nos livros

Por DIRK JOHNSON

CHICAGO - O hábito de escrever comentários nas margens dos livros é um rico passatempo literário. Mas seu destino no mundo digital é incerto. "As pessoas vão sempre encontrar uma maneira de anotar eletronicamente", disse Thomas Tanselle, professor-adjunto de inglês na Universidade Columbia, em Nova York. "Mas há a questão de como isso será preservado."
Problemas desse tipo são ponderados pelo Caxton Club, um grupo literário fundado no distante ano de 1895. Em parceria com a Biblioteca Newberry, de Chicago, o Caxton vai realizar um simpósio para apresentar um novo volume de ensaios a respeito de livros que pertenceram a autores ou foram anotados por eles. Os ensaios abordam exemplares que vinculam o presidente Lincoln a Alexander Pope; Jane Austen a William Cowper; Walt Whitman a Henry David Thoreau.
Samuel Taylor Coleridge foi um prolífico anotador de margens, assim como William Blake e Charles Darwin.
No século 20, a prática chegou a ser equiparada à pichação: algo que gente elegante e bem educada não faz.
Paul Gehl, curador da Newberry, culpou sucessivas gerações de bibliotecários e professores por "nos infligir a ideia" de que escrever nos livros os deixa "estragados ou danificados".
Em 1977, quando estava preso na África do Sul, Nelson Mandela escreveu seu nome junto a uma passagem de "Júlio César" que diz: "Os covardes morrem muitas vezes antes de suas mortes".
O historiador oral Studs Terkel era conhecido por repreender amigos que lessem seus livros e os deixassem sem marcas. Dizia-lhes que a leitura de um livro não deveria ser passiva, mas uma conversa barulhenta.
Livros anotados são crescentemente vistos hoje em dia como mais valiosos, não apenas por sua conexão com as celebridades, mas também pelo que revelam das pessoas associadas a uma obra, disse Heather Jackson, professora de inglês na Universidade de Toronto.
Para ela, a análise das anotações nas margens revela um padrão de reações emocionais entre os leitores comuns, que do contrário passaria despercebido até mesmo por profissionais da literatura.
"Pode ser um pastor que escreva nas margens sobre o que um livro significa para ele no momento em que ele está fora cuidando de seu rebanho", disse Jackson. "Pode ser uma estudante que nos diz como se sente."
Mas nem todos dão tal valor às anotações nos livros, disse Paul Ruxin, membro do Caxton Club. "Se você pensar na visão tradicional de que o livro é apenas texto", afirmou, "então isso é meio que uma tolice".
David Spadafora, presidente da Newberry, disse que as anotações enriquecem o livro, já que os leitores inferem outros significados e lhes conferem um contexto histórico. "A revolução digital é boa para o objeto físico", disse ele. Quanto mais as pessoas virem os artefatos históricos na forma eletrônica, "mais vão querer encontrar o objeto real".


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