São Paulo, segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

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Ideias abstratas? O corpo as toma literalmente

NATALIE ANGIER
ENSAIO

Pesquisadores da Universidade de Aberdeen (EUA) descobriram que, quando pessoas eram solicitadas a lembrar fatos passados ou imaginar o futuro, seus corpos subliminarmente exibiam as metáforas embutidas em nosso modo habitual de conceituar o fluxo do tempo.
Quando pensavam em anos passados, os participantes se inclinavam ligeiramente para trás e, quando fantasiavam sobre o futuro, pendiam para a frente.
"Foi agradável ver que podíamos tomar um conceito abstrato como o tempo e mostrar que ele se manifestava em movimentos corporais", disse Lynden K. Miles, que conduziu o estudo.
Publicado em janeiro na revista "Psychological Science", o estudo faz parte do campo chamado cognição incorporada, a ideia de que o cérebro não é a única parte nossa que tem uma mente própria. "O modo como processamos a informação está relacionado não só a nossos cérebros, mas a todo o corpo", disse Nils B. Jostmann, da Universidade de Amsterdã.
"Usamos todos os sistemas disponíveis para chegar a uma conclusão e dar sentido aos fatos."
Em um recente estudo da Universidade Yale, os pesquisadores dividiram 41 estudantes em dois grupos e pediram aos membros do grupo A para segurar uma xícara de café quente e aos do grupo B para segurar uma de café gelado. Os pesquisadores então pediram aos estudantes que avaliassem a personalidade de um indivíduo imaginário com base em uma série de informações.
Os estudantes que haviam segurado a bebida quente tinham maior probabilidade de julgar o personagem fictício como caloroso e amigável do que aqueles que tinham segurado o café gelado.
Em relatório publicado em agosto em "Psychological Science", Jostmann e seus colegas notaram, por exemplo, que quando os estudantes eram informados de que determinado livro era vital para o currículo, julgavam o livro fisicamente mais pesado do que os demais estudantes.
Os pesquisadores queriam saber se a sensação de peso poderia influenciar as opiniões das pessoas.
Em uma série de experimentos na Holanda, estudantes responderam a questionários que estavam presos a uma prancheta metálica com um compartimento no verso capaz de conter papéis. Em alguns casos os compartimentos estavam vazios, e então a prancheta pesava apenas 0,6 quilo. Em outros casos, os compartimentos estavam cheios, elevando o peso para 1 quilo. Os participantes seguraram uma prancheta leve ou pesada. Em uma delas pedia-se para os estudantes estimarem o valor de seis moedas estrangeiras desconhecidas. Em outra, os estudantes indicavam o quão importante consideravam que um comitê universitário levasse em conta suas opiniões ao decidir o valor das bolsas para estudantes estrangeiros. Em um terceiro experimento, pediu-se que os participantes dissessem se estavam satisfeitos com (a) a cidade de Amsterdã e (b) seu prefeito.
Os estudantes que seguravam a prancheta mais pesada julgaram as moedas mais valiosas do que aqueles que tinham as pranchetas leves. Os participantes com pranchetas pesadas também insistiram em que os estudantes deveriam ter influência nos assuntos financeiros da universidade. Eles, além disso, adotaram uma mentalidade mais rigorosa e se mostraram mais inclinados a considerar a conexão entre as condições de vida em Amsterdã e a eficácia do prefeito.
"Como os humanos veem a gravidade é útil do ponto de vista evolucionário", disse Jostmann. "Algo pesado é algo de que você deve cuidar. Coisas pesadas não são fáceis de empurrar, mas podem nos empurrar." São assuntos pesados em todos os sentidos da palavra.


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