São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

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DIÁRIO DE CUSCO

Polêmica no Peru: Quem falou em "cidade perdida"?

Por SIMON ROMERO

CUSCO, Peru - Seja nos cartões postais em que sua imagem faceira aparece de chapéu de feltro, ou no trem turístico de luxo que leva o seu nome, a figura de Hiram Bingham é onipresente em Machu Picchu, pois há quase um século esse explorador da Universidade Yale (EUA) leva o crédito por ter revelado a dita cidade perdida dos incas para o resto do mundo.
No entanto, nos últimos meses, uma série de fatos ameaça virar de ponta-cabeça o legado de Bingham, que foi a clara fonte de inspiração para o fictício arqueólogo Indiana Jones. O Peru ameaça processar a Universidade Yale para recuperar milhares de artefatos retirados por Bingham. Surgiram indícios de que um aventureiro alemão pode ter chegado antes. E há uma polêmica sobre quem era o dono do terreno quando Bingham supostamente o descobriu.
Os círculos acadêmicos peruanos fervilham com debates revisionistas. É possível que Bingham não só não tenha tido um pioneirismo tão heróico quanto a história atualmente lhe atribui, como também pode ser que a cidade perdida dos incas nunca tenha de fato sido perdida.
Ninguém no campo dos estudos de Machu Picchu contesta seriamente o fato de que Bingham chegou às ruínas engolidas pela selva em 1911, escavou-as, fotografou-as e as divulgou ao mundo. Mas, ao longo do tempo, diversas afirmações dele têm sido contestadas por especialistas.
"Hiram Bingham nunca pensou que alguém fosse obstinadamente investigar sua trilha", disse a historiadora peruana Mariana Mould de Pease.
Logo depois das expedições de Bingham a Machu Picchu, surgiram afirmações de que o missionário britânico Thomas Payne e o engenheiro alemão J. M. von Hassel o teriam suplantado na corrida. E mapas descobertos por historiadores mostram referências a Machu Picchu já em 1874.
A mais nova polêmica surge com a recém-publicada tese de que um aventureiro alemão pode ter chegado ao local e saqueado as ruínas décadas antes de Bingham ter posto os pés no Peru. Há registros de que esse alemão, Augusto Berns, adquiriu na década de 1860 terras em frente à montanha de Machu Picchu, construiu uma serraria e tentou captar recursos para pilhar a vizinha cidadela inca, tudo com as bênçãos do governo peruano.
"A informação sobre Berns é uma questão que tem de ser investigada mais profundamente", disse o proeminente antropólogo peruano Jorge Flores Ochoa. "Hiram Bingham pintava a si mesmo como um grande explorador que se aventurou até os confins da Terra, mas isso era uma fantasia. A verdade é que outros, talvez muitos outros, chegaram a Machu Picchu muito antes dele."
Para outros na cidade de Cusco, as ações de um alemão outrora esquecido pela história mostram como Machu Picchu pode ter sido achada e perdida repetidamente desde que os incas a abandonaram.
David Ugarte Vega, antropólogo da Universidade Nacional de San Antonio Abad, em Cusco, disse: "Só sei que tudo era possível naqueles turbulentos anos antes que Bingham fosse a Machu Picchu, com outros provavelmente chegando mesmo antes desse alemão".


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