São Paulo, segunda-feira, 16 de maio de 2011

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Rebeliões árabes desafiam ascensão turca

Por ANTHONY SHADID

BEIRUTE, Líbano - Os distúrbios que varrem o mundo árabe geram desafios à crescente influência política e econômica da Turquia na região e à sua tradicional postura de não permitir que problemas se agravem nas suas fronteiras.
Nos últimos anos, a Turquia (que não é um país árabe) se tornou a mais dinâmica potência do Oriente Médio. Mas as várias semanas de diplomacia turca na Líbia desmoronaram em 2 de maio, e o pemiê da Turquia pediu a renúncia do coronel Muammar Gaddafi. Algo similar pode estar à espera na Síria, onde o ditador Bashar al Assad prometeu aos dirigentes turcos que promoveria reformas, mas persistiu na repressão aos protestos. No Iraque, a Turquia receia que o governo local seja incapaz de manter a estabilidade enquanto os EUA completam sua retirada militar. E o Líbano está entrando no seu quarto mês sem um governo.
"Diante dessa mudança no mundo árabe, a política externa turca está enfrentando um sério revés", disse Sami Kohen, colunista do jornal turco "Milliyet". Na opinião dele, o premiê Recep Tayyip Erdogan "começou a perder lideranças árabes nas quais confiava e que considerava importantes, uma após a outra".
A Síria pode ser o maior desafio, pois ecoa amplamente a experiência dos seus vizinhos nos últimos quatro meses. Na Tunísia, no Egito e agora na Líbia e no Iêmen, os governos relutaram em entregar parte do seu poder para sobreviverem, mas, então, acabaram enfrentando a perspectiva de perderem todo o poder. Assad também rejeita os apelos por mudanças.
Nas últimas semanas, a diplomacia turca tem sido intensa com a Síria, vista por Ancara como peça-chave na estratégia regional de maior integração econômica. Assad e Erdogan já conversaram por telefone ao menos três vezes, e o chefe da inteligência turca foi duas vezes a Damasco desde o início da rebelião. Sua mensagem foi de que o prazo para realizar reformas estava acabando.
Do Iraque ao norte da África, a crescente influência turca no mundo árabe emergiu como uma das mais notáveis dinâmicas da região. O comércio com o Iraque ficou em torno de US$ 6 bilhões em 2010, quase o dobro do que era em 2008. Ali, exigências de vistos foram derrubadas, facilitando o comércio entre prósperas regiões fronteiriças, e ajudando cidades, como a síria Aleppo, a se reconectarem com seu entorno histórico. Cerca de 25 mil turcos chegaram à Líbia para trabalhar em canteiros de obras. A cultura pop turca está por todo lado: o astro da série de ação "Vale dos Lobos" é tão famoso que empresta seu nome a cafés iraquianos.
Desde janeiro, a Turquia busca proteger esses avanços em meio aos tumultos na região. Embora seus laços com o Egito fossem menos profundos do que com outros países árabes, Erdogan fez um apelo para que o então ditador Hosni Mubarak renunciasse, enquanto um enviado americano ainda insistia que Mubarak deveria concluir seu mandato.
Mas a Turquia sofre reveses em outros lugares. No Iraque, uma coalizão que Ancara ajudou a criar foi derrotada por outra, comandada pelo premiê Nuri al Maliki. Diplomatas turcos tentaram chegar a uma solução negociada na Líbia, mas queixam-se de que as autoridades líbias mentiram sobre sua disposição em impor um cessar-fogo. Autoridades turcas disseram que vão cortejar a oposição líbia de forma mais ostensiva nas próximas semanas.
Mas a Turquia não chegou a tanto no caso da Síria, país com o qual quase foi à guerra em 1998 por causa do apoio de Damasco à guerrilha curda. Desde então, a Turquia promove sua relação com a Síria como um modelo. Os dois países já realizaram reuniões ministeriais conjuntas e até exercícios militares. O comércio triplicou em três anos, e considera-se que Assad e Erdogan nutrem um apreço mútuo.

Colaboraram com a reportagem Sebnem Arsu, de Istambul, Hwaida Saad e Nada Bakri, de Beirute, e um funcionário que pertence ao jornal "The New York Times" em Damasco


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