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No México, campos prosperam com esgoto
Por ELISABETH MALKIN
MIXQUIAHUALA, México - Dia e noite, Marcelo Mera Bárcenas chapinha na água
fétida que já percorreu 96 km morro abaixo, desde os esgotos da Cidade do México, e
que se espalha pelos campos de milho e alfafa de Mixquiahuala, uma terra que já foi
árida.
Das estradas no vale de Mezquital, os campos se estendem até os morros em vários tons
de verde, enfeitados por salgueiros. Mas, de perto, onde Mera é pago por hectare de
campo que irriga, o cheiro e a aparência da água que alimenta essa abundância sufocam
os sentidos.
Usando apenas botas de borracha como proteção, ele não aprova a crença geral local de
que a água é inofensiva, de que um banho com detergente toda noite é capaz de curar
todos os males que ela possa trazer. Bolhas surgem em suas mãos, ele diz, e está sempre
resfriado ou gripado.
"É claro que isso nos afeta, porque a água é muito suja", diz Mera, que trabalha na lama
desses campos há 38 anos, desde que tinha 15. "Mas não há outra coisa a fazer."
Há cem anos a Cidade do México bombeia seus esgotos para o norte para irrigar as
terras do Estado de Hidalgo. Essa cascata fétida que os agricultores chamam de "águas
negras" percorre um labirinto de canais e depois escorre sobre os campos.
Por isso, quando se soube que o governo finalmente ia construir uma usina gigantesca
de tratamento de esgotos, era de se esperar que os agricultores da região ficassem
entusiasmados. Mas eles estão desconfiados.
"Sem aquela água não há vida", disse Gregorio Cruz Alamilla, 60, que trabalha na
fazenda de 5 hectares de sua família desde que era menino.
Cruz sabe que a água é carregada de substâncias tóxicas, incluindo produtos químicos
despejados por fábricas, e ele se cansa de limpar seu campo de garrafas plásticas e
embalagens toda vez que o irriga.
Mas, como muitos outros ali, ele teme que o tratamento da água, embora possa retirar
poluentes nocivos, também remova alguns dos fertilizantes naturais que até as
autoridades dizem que ajudaram a tornar esse vale tão produtivo.
E, apesar das garantias do governo, os agricultores suspeitam o pior: que quando a água
for tratada será bombeada de volta para a Cidade do México, deixando as fazendas
secas.
"Se eles tirarem as águas negras, vamos morrer de fome", disse Cruz. "Não sabemos
fazer outra coisa."
Os agricultores irrigam as plantações com água de esgotos em todo o mundo em
desenvolvimento, mas em nenhum outro lugar na escala do vale de Mezquital, dizem
pesquisadores. Os 900 quilômetros quadrados dos campos irrigados do vale ficam no
final de um labirinto de túneis, rios, lagos, represas e reservatórios que datam do século
14. A Cidade do México nunca conseguiu manter essas águas à distância. Quando elas
transbordam, como fazem quase todo ano na temporada de chuvas, o esgoto jorra pelas
ruas.
"Era um problema previsível, mas nunca lhe demos atenção suficiente", disse Ernesto
Espino de la O, que administra o projeto de abastecimento e tratamento de água para a
Comissão Nacional da Água.
Para impedir as inundações, o governo federal está construindo um túnel de 62 km que
conduzirá todo o esgoto para o norte.
Para os agricultores dali, a prova de que sua água é boa está no que eles veem ao seu
redor. "As plantas não absorveriam veneno; elas morreriam", disse Jesús Aldana
Ángeles, 75, agricultor de quinta geração que observava seu pequeno rebanho de
carneiros mastigar os restos da colheita de alfafa. Ele atravessou um caminho sobre um
canal de irrigação que rodeia sua casa como um fosso preto. "Água ruim não deixaria
nada verde", ele disse. "Mas aqui as águas negras deixam tudo fértil."
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