São Paulo, segunda-feira, 17 de agosto de 2009

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ENSAIO

JOHN TIERNEY

A Terra esquenta? Ajuste o termostato

Os líderes do G8 decretaram, no mês passado, que a temperatura média do planeta não deve subir mais do que 2?C acima do nível atual. Mas e se a Mãe Terra não receber o comunicado? Como manteremos a frieza no futuro?
Duas opções. Plano A: continue falando do clima. Essa tem sido a abordagem preferida na Europa ocidental, onde os líderes gostam de prometer uns aos outros que esfriarão o planeta graças a uma drástica redução das emissões de carbono. Aí, como as emissões dos seus países continuam crescendo, eles se reúnem para fazer novas promessas e jurar que agora é para valer.
Plano B: faça algo. Originalmente chamada bioengenharia, essa abordagem costumava ser desprezada como sendo fantasiosa: resfriar o planeta com partículas bloqueadoras solares ou sombras; manipular nuvens para torná-las mais reflexivas; remover carbono da atmosfera.
Hoje, esta abordagem atende pelo nome de engenharia climática e parece mais prática. Várias análises recentes dessas ideias concluem que resfriar o planeta seria técnica e economicamente viável.
Ainda há muitos céticos, mas mesmo eles começaram a defender mais pesquisas sobre a engenharia climática. Os céticos temem as consequências inesperadas de mexer com o termostato do planeta, mas também temem a possibilidade -quase certeza, eu diria- de que os líderes políticos tão logo não irão reduzir seriamente as emissões de carbono de seus países.
A Academia Nacional de Ciências dos EUA e a Real Sociedade Britânica estão preparando relatórios sobre a engenharia climática, e Barack Obama prometeu levá-los em conta. Mas, até agora, não há praticamente nenhum apoio do governo dos EUA para a pesquisa e o desenvolvimento -certamente nada como as dezenas de bilhões de dólares alocadas para a energia limpa e outros programas cujos efeitos sobre o clima só serão sentidos daqui a décadas.
Por talvez US$ 100 milhões, os engenheiros climáticos poderiam iniciar testes de campo dentro de cinco anos, diz Ken Caldeira, do Instituto Carnegie para a Ciência. Caldeira é membro de um grupo de estudos de engenharia climática que se reuniu em 2008 no Instituto Kavli de Física Teórica, sob a liderança de Steven Koonin, que posteriormente assumiu o cargo de subsecretário para ciência do Departamento de Energia dos EUA. O grupo acaba de divulgar um relatório analisando o uso de partículas de aerossol para refletir a radiação solar de ondas curtas de volta para o espaço.
Essas partículas poderiam ser atiradas na estratosfera para reproduzir os efeitos dos aerossóis de sulfato das erupções vulcânicas, com a do monte Pinatubo, em 1991, que provocou uma redução de cerca de 0,5?C na temperatura global. Assim como naquela erupção, os efeitos sumiriam com a queda das partículas na Terra. Manter o planeta constantemente resfriado poderia custar US$ 30 bilhões por ano, caso as partículas fossem lançadas por artilharia militar, ou US$ 8 bilhões, se fosse jogadas de avião, segundo o relatório.
Só a ideia de testar isso já assusta muita gente, mas Caldeira diz que um experimento em pequena escala seria mais seguro do que a alternativa existente.
"O pior cenário", diz ele, "é aquele em que você tem um sistema não testado, que precisa empregar rapidamente em grande escala, numa tentativa desesperada de evitar algum tipo de crise climática".
Outra forma de resfriar o planeta seria borrifar a bruma do mar a partir de navios na direção das nuvens baixas, o que as tornaria mais brilhantes e as faria refletirem mais luz solar. Por US$ 9 bilhões, essa tecnologia poderia compensar um século de aquecimento global, segundo J. Eric Bickel e Lee Lane, em relatório publicado em 7 de agosto pelo Centro do Consenso de Copenhague.
Outros pesquisadores consideram impossível fazer uma análise de custo-benefício dessas propostas de engenharia, dada a incerteza em torno dos possíveis efeitos adversos. Na atual edição da "Science", Gabriele Hegerl e Susan Solomon apontam uma queda na precipitação pluviométrica global depois da erupção do Pinatubo e alertam que a engenharia climática poderia levar a secas perigosas.
Uma forma menos arriscada de engenharia climática seria retirar gradualmente o dióxido de carbono da atmosfera. Alguns especialistas argumentam que já existe tecnologia para tornar esse método de "captura do ar" razoavelmente econômico e que as vantagens políticas fazem dessa a estratégia mais realista em longo prazo.
Embora não seja fácil alcançar um acordo internacional sobre como reajustar o termostato do planeta, seria menos complicado do que negociar um tratado global de carbono.
A engenharia climática não exige unanimidade ou implantação resoluta no mundo todo. Em vez de depender de promessas que variam ao sabor do clima político, talvez seja mais simples lidar diretamente com o clima da Mãe Terra.


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