São Paulo, segunda-feira, 18 de maio de 2009

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Nos ossos, um sistema de surpreendente elasticidade


Um tecido que entrelaça o elástico e o rígido

Por NATALIE ANGIER

Quando Harry Eastlack tinha cinco anos, ele quebrou a perna esquerda enquanto brincava com sua irmã. A fratura não sarou adequadamente, e logo seu quadril e seu joelho também ficaram rígidos. Examinando o menino, os médicos encontraram formações anormais de osso nos músculos de sua coxa. Em poucos anos, depósitos ósseos haviam se espalhado pelo corpo de Harry, infiltrando seu peito, seu pescoço, suas costas e suas nádegas. Os cirurgiões tentavam cortar os excessos de osso, mas os viam crescer mais espessos e mais invasivos.
Quando ele tinha 20 e poucos anos, suas vértebras tinham se fundido e seus músculos das costas haviam sido substituídos por ossos sólidos. Sua mandíbula travou e ele morreu de pneumonia em 1973, pouco antes de completar 40 anos.
Hoje o esqueleto de Eastlack pode ser visto no Museu Mutter do Colégio de Médicos da Filadélfia (EUA).
Eastlack sofria de uma rara e pouco conhecida doença congênita chamada fibrodisplasia ossificante progressiva, em que cortes, hematomas e traumas no corpo acabam sendo “reparados” por células destinadas a construir ossos. A doença devastadora revela características fundamentais do surpreendente tecido conectivo que é o osso. Embora possa parecer pedra, ele é incansável, ambiciosamente vivo.
Pesquisadores descobriram que uma série de hormônios metabólicos e reprodutivos ativam os tecidos ósseos. Entre as revelações mais instigantes está a de que o osso se acelera ao toque de serotonina e oxitocina, indicando moléculas frequentemente associadas a humores de alegria e amizade do que à integridade da coluna dorsal.
“Nenhum órgão é uma ilha”, disse Gerard Karsenty, professor de genética e desenvolvimento na Universidade Columbia. “E o esqueleto está ligado funcionalmente a muito mais órgãos do que prevíamos.”
O esqueleto permite nossa locomoção, o que significa que é constantemente agredido. Ele suporta os abusos e resiste às grandes rupturas ao promover microfraturas. Os ossos também têm uma equipe de conserto de fraturas, em todos os sentidos da palavra: células osteoclastas que escavam ao redor das rachaduras, usando ácidos para eliminar a antiga matriz, e células osteoblastas que imigram e secretam novos preenchimentos de osso. “A remodelagem dos ossos ocorre simultaneamente em centenas de locais por dia”, disse Karsenty.
Uma ligação candidata entre o alimentar e o arquitetônico é o hormônio serotonina. Em uma reportagem em novembro passado na revista “Cell”, Karsenty e seus colegas mostraram que, ao reduzir a velocidade da liberação de serotonina no trato gastrintestinal, eles podiam evitar a osteoporose em ratos. E como a barreira de sangue do cérebro mantém as reservas de serotonina bem compartimentalizadas acima e abaixo do pescoço, uma abordagem semelhante poderia ser experimentada em seres humanos.


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