São Paulo, segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

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EDITORIAL DO "NEW YORK TIMES"

É hora de regulamentar

A crise financeira já dura mais de um ano. Intensificou-se durante toda a campanha presidencial e persistiu durante a transição pós-eleitoral. E mesmo assim ainda não está claro o que o presidente eleito Barack Obama tem em mente quando promete "um marco regulatório do século 21".
Já os contornos do desafio estão claros. O modelo das últimas décadas -em que o Tesouro e outros reguladores federais confiaram menos nas regras e na fiscalização do que na disciplina do mercado- foi um fracasso manifesto. Qualquer coisa aquém de um novo regime, baseado em regras, seria inadequada para restaurar a confiança e recuperar a economia. E qualquer novo regime deve se fundamentar na disposição de regulamentar.
Obama poderá cumprir sua promessa? Sem um sinal claro do novo presidente, os primeiros indícios não são animadores. Não há nenhum defensor proeminente dos consumidores e investidores entre os seus principais consultores econômicos. À exceção de Paul Volcker, ex-presidente do Fed (Banco Central americano), não há autoridades ou reguladores que tenham se distinguido por alertarem à catástrofe iminente ou por tomarem medidas incisivas contra excessos que a estivessem provocando.
Mary Schapiro, indicada por Obama para dirigir a SEC (Securities and Exchange Comission, agência que regulamenta o setor financeiro), teve boa passagem por cargos regulatórios no governo e na iniciativa privada, mas é mais conhecida por seu apoio à autorregulamentação mais baseada em princípios do que em regras claras. A escolha de Gary Gensler para a Comissão do Mercado Futuro de Commodities, que regulamenta contratos futuros, é ainda mais perturbadora.
Gensler, ex-banqueiro do Goldman Sachs, uma das maiores corretoras de commodities, foi secretário-assistente do Tesouro de Bill Clinton (1993-2001). Em 2000, orientou a redação de projeto que isentava os derivativos da supervisão federal, o que incluía operações virais com "credit default swaps" (derivativos de crédito), que amplificaram a atual crise.
"Swaps" e demais derivativos precisam ser regulamentados. Os EUA precisam de uma Bolsa onde eles sejam abertamente comercializados e fiscalizados.
A nova legislação para o setor terá de ser aprovada no Congresso, mas a contribuição da agência reguladora federal do setor será importante na redação e na implementação das leis. Como se posiciona Gensler? Como sua estreita ligação com Wall Street afeta suas decisões? Eis algo que os senadores deveriam perguntar na audiência de confirmação.
Um indício da seriedade de Obama em relação à reforma do marco regulatório será se as autoridades tentarão acomodá-la nos termos de uma reformulação da estrutura da regulamentação. Há agências reguladoras demais, com autoridades superpostas, mas a nova estrutura deve derivar de novas regras, e não o contrário.
E Washington deverá impor regras também aos fundos de hedge. Houve um tempo em que instituições grandes demais para falir representavam o maior perigo à economia. A crise demonstrou que instituições financeiras podem se tornar tão interconectadas que permitir sua quebra seria igualmente perigoso. A solução é regulamentar os participantes financeiros de fora do sistema bancário formal.
Tudo isso seria apenas o começo. Uma falsa suposição deve ser abandonada: a de que proteger consumidores e investidores individuais limita indevidamente os lucros corporativos e a inovação financeira. Já é hora de que se crie uma agência de segurança do crédito ao consumidor. Um processo para determinar o efeito de práticas e produtos financeiros sobre os consumidores poderia ter evitado a atual crise.
Talvez as pessoas que contribuíram para esta bagunça estejam mais bem equipadas para arrumá-la. A ver. Mas será trágico se Wall Street concluir, a partir das escolhas de Obama, que não haverá mudanças fundamentais em sua busca por lucros. Saberemos que as novas regras estão funcionando quando Wall Street começar a se preocupar.


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