São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 2011

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DINHEIRO & NEGÓCIOS

Malásia assume risco para refinar os metais de terras-raras

Uma refinaria que pode reduzir controle da China

Por KEITH BRADSHER
KUANTAN, Malásia - Um projeto colossal em construção em Kuantan, na Malásia, poderá ajudar a determinar se o mundo conseguirá romper o monopólio chinês sobre os metais estratégicos que são cruciais para produtos tão diversos quanto o iPhone da Apple, o Prius da Toyota e as bombas inteligentes da Boeing.
Em breve, até 2.500 operários da construção estarão correndo para terminar a maior refinaria mundial dos chamados metais de terras-raras -a primeira usina desse tipo a ser construída fora da China em quase três décadas.
Hoje, a China extrai e refina pelo menos 95% do suprimento global de terras-raras. E Pequim suscitou preocupação internacional ao usar esse virtual monopólio como arma no comércio mundial.
Em setembro passado, por exemplo, durante disputa territorial entre os dois países, a China impôs embargo de dois meses sobre o envio de terra-rara ao Japão. Mas países que possuem reservas de minérios de terras-raras não se mostram ansiosos por ter refinarias que as processem, pois geram poluição e lixo radioativo. É isso que explica o fato de a mineradora australiana gigante Lynas estar se apressando a concluir a construção de uma refinaria de US$ 230 milhões nos arredores do porto industrial de Kuantan, na Malásia.
Em dois anos, diz a Lynas, a refinaria será capaz de suprir quase um terço da demanda mundial por terras-raras -sem levar em conta a China.
A refinaria representa uma aposta nas chances de o processamento poder ser feito com segurança suficiente para que os riscos ambientais locais justifiquem as recompensas globais prometidas.
Nicholas Curtis, o presidente executivo da Lynas, disse que custaria quatro vezes mais construir e operar uma refinaria desse tipo na Austrália, onde os custos de construção e mão de obra são muito mais altos. O governo malasiano mostrou-se ansioso em receber o investimento da Lynas, tendo chegado a oferecer isenção fiscal de 12 anos à empresa. Se os preços das terras-raras se mantiverem nos níveis atuais, a refinaria vai gerar US$ 1,7 bilhão por ano em exportações a partir do final do próximo ano, valor que equivale a quase 1% da economia da Malásia.
Raja Dato Abdul Aziz bin Raja Adnan, diretor-geral do Conselho Malasiano de Licenciamento de Energia Atômica, disse que seu país aprovou o projeto depois de uma revisão realizada por várias agências ter indicado que o minério importado e o lixo subsequente terão níveis de radioatividade suficientemente baixos.
A última refinaria de terras-raras da Malásia, operada pela empresa japonesa Mitsubishi Chemical, hoje é um dos maiores sítios de limpeza de lixo radioativo da Ásia.
"A palavra 'baixa', neste contexto, é apenas uma questão de percepção -material é carcinogênico", disse o toxicologista Jayabalan A. Thambyappa. Casos de leucemia foram atribuídos à antiga refinaria da Mitsubishi.
As terras-raras não são radioativas por si. Mas todo depósito de minério contém elemento levemente radioativo, o tório.
As preocupações com a radiação ajudaram a forçar o Japão a fechar suas refinarias de terras-raras. A Mitsubishi, então, transferiu sua operação de refino para a Malásia, onde antigas minas de estanho tinham deixado milhares de toneladas de escória semiprocessada que era rica em minério de terras-raras.
A escória também tinha níveis muito altos de tório.
A refinaria da Lynas terá o que há de mais moderno em equipamentos de controle de poluição. Poços de armazenamento temporário forrados de plástico ficarão sobre argila quase impenetrável, para conter os subprodutos radioativos até que eles possam ser levados para outro local.
Nicholas Curtis disse que o minério importado da Austrália terá entre 3% e 5% da concentração de tório por tonelada encontrada na escória das minas de estanho processado pela Mitsubishi.
Depois de usar ácido sulfúrico para dissolver as terras-raras, a Lynas pretende misturar a parte radioativa do lixo com cal, diluindo-a a uma concentração de 0,05%.
A mineradora quer converter essa mistura em grandes formas de concreto, conhecidas como tetrápodes, que são usadas para construir recifes artificiais.
Os moradores de Kuantan parecem estar divididos em relação à construção de uma grande refinaria perto do estreito e lodoso rio Balok, que já tem várias fábricas químicas ao longo de suas margens. O rio deságua no mar ao lado de uma vila de pescadores, onde em uma noite recente um grupinho de pescadores estava sentado na ponta de um píer de madeira.
Muhamad Ishmail, 56, disse que a poluição das fábricas químicas que começaram a ser abertas rio acima na década de 1990 forçara a pesca, que, durante gerações, foi praticada no rio, a ser transferida para o mar. "Antigamente, este rio era limpo. Pegávamos peixe aqui mesmo", disse ele.
Mas Muhamad Anuar, 30, comentou que a comunidade precisa dos salários regulares que a Lynas poderá oferecer. "Tenho dois filhos e não quero que sejam pescadores", explicou. "É um trabalho cansativo."


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