São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 2011

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Tecendo alquimias a partir da aranha

Por HENRY FOUNTAIN
A seda tecida pelas aranhas -seja ela uma massa pegajosa ou um fio muito elástico e resistente- pode ser útil às pessoas.
"Não há só um tipo de material", disse Cheryl Hayashi, da Universidade da Califórnia, Riverside, que estuda a genética evolutiva da seda das aranhas. "Quer uma cola? Há uma seda que já é cola."
Há anos se especula que a seda da aranha poderia ser usada para produzir cabos mais fortes que os de aço ou coletes blindados mais eficazes que os de kevlar. Mas há um problema: embora uma aranha comum possa fabricar cinco tipos de seda, ela não produz nenhum deles em grande quantidade. Obter volumes comerciais é impossível -as aranhas são solitárias e exigem uma dieta de insetos vivos, e algumas são canibais; fazer uma criação de aranhas, portanto, está fora de cogitação.
Por isso, os pesquisadores estão tentando desvendar os segredos das fiandeiras, para produzir a seda em laboratório ou transferir geneticamente essa capacidade a outros organismos que sejam capazes de fabricá-la em grande quantidade. Mas os materiais obtidos não têm toda a força, elasticidade e outras qualidades do original.
Alguns cientistas estão tentando reinventar a única seda que é abundante, a do bicho da seda, pensando em materiais que poderiam ir além do sonho dos coletes à prova de balas.
Entre esses pesquisadores está David Kaplan, da Universidade Tufts, perto de Boston. O grupo de trabalho dele, reunindo também colegas das Universidades de Illinois e de Pensilvânia, recentemente desenvolveu matrizes de eletrodos que podem ser impressas em películas de seda flexíveis e degradáveis. Essas matrizes -delgadas a ponto de se moldarem à superfície cerebral- poderão, no futuro, ser usadas no tratamento da epilepsia e de outras doenças.
Há séculos, começando pela China, a seda é produzida comercialmente pelo cultivo do bicho da seda, que é a larva de uma mariposa. Mas, segundo Hayashi, as lagartas só produzem um tipo de fibra, enquanto as aranhas têm "a caixa de ferramentas completa".
David Porter, cientista da Universidade de Sheffield, no Reino Unido, disse que os esforços para fazer um equivalente sintético da seda da aranha não resultam em materiais muito diferentes de outros polímeros. "Quase qualquer um consegue fazer uma seda razoável", disse Porter. "Mas não dá realmente para diferenciá-lo de um bom nylon. Para diferenciar o produto natural, é realmente preciso obter as vantagens que a natureza incorpora."
A seda é uma proteína fibrosa, produzida por glândulas. A seda, que é um líquido no interior do organismo, torna-se sólida ao deixá-lo. As proteínas se dobram de maneiras complexas, dando a cada tipo de seda as suas propriedades únicas. Há limitações para produzir a proteína da seda de aranha em outros organismos, pois o processo de reconstituir as proteínas arruína qualquer padrão relacionado às dobraduras. Mas Kaplan, que passou anos aprendendo os mecanismos fundamentais de montagem da seda, está obtendo progressos. "O processo inteiro", disse ele, "está sendo construído em torno de controlar o teor de água".
Ele acha que, no futuro, plantas transgênicas serão capazes de produzir uma seda da aranha que possa ser colhida como algodão. Enquanto isso, ele trabalha com a seda reconstituída do bicho da seda, criando novos tipos de películas e outros materiais.
A equipe de Kaplan tem se concentrado nas aplicações biomédicas, em campos como a engenharia dos tecidos biológicos. Um pós-doutorando dele desenvolveu um processo térmico que reconstitui lentamente a seda na presença da água.
Isso levou à ideia de fazer córnea artificial. Mas uma córnea precisa ser permeável, então Kaplan chamou um especialista em raios laser, Fiorenzo Omenetto.
Com base no trabalho de Omenetto, películas de seda poderiam ser usadas na criação de biossensores implantáveis ou na administração de medicamentos, pois a seda se dissolveria no organismo liberando a droga.
Uma vantagem da seda, segundo Omenetto, é que a produção de películas e outras estruturas é "limpa" -à base de água e a baixas temperaturas.
Na Universidade Tufts, outra ideia é usar a seda como base para metamateriais, capazes de manipular a luz ou outra radiação eletromagnética. Ao produzir estruturas em películas de seda e depositar metais, antenas de metamateriais poderiam ser desenvolvidas para monitorar a saúde no interior do organismo.
O potencial é enorme, segundo Omenetto, algo que ele percebeu assim que foi chamado para abrir buracos na seda. "Parecia um material óptico legal", disse ele. "E eu não tenho dormido muito desde então."


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