São Paulo, segunda-feira, 21 de junho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Mão de obra começa a se rebelar na China


Maiores salários devem resultar em mais consumo

Por DAVID BARBOZA e HIROKO TABUCHI

XANGAI - O poder de barganha que o exército de mão de obra barata da China está adquirindo com a ajuda de greves, suicídios e pressão do governo está mudando a dinâmica empresarial do país.
Salários mais altos e melhores condições de trabalho poderão levar algumas empresas a considerar transferir a produção para outros lugares, enquanto tornam a China um mercado mais atraente para seus produtos.
"Companhias que buscavam na China apenas custos menores precisam mudar de rumo", disse Tomoo Marukawa, especialista em economia chinesa na Universidade de Tóquio.
Após anos concentrado em atrair investimento estrangeiro, o governo chinês está apoiando esforços para melhorar as condições dos trabalhadores e aumentar os salários.
Analistas dizem que Pequim silenciosamente aceita a necessidade de modificar seu modelo industrial de baixo custo, esperando estimular o consumo interno, reduzir a enorme disparidade de renda entre ricos e pobres e evitar tumultos sociais por causa dos preços crescentes dos alimentos e da moradia.
Ma Jun, economista de Hong Kong, disse que muitas cidades e Províncias chinesas logo aumentarão seus salários mínimos entre 10% e 20%. Trabalhadores fabris no sul da China hoje ganham cerca de US$ 0,75 por hora.
"O aumento mais rápido que o esperado do custo da mão de obra tornou-se um imperativo político", disse Ma em um relatório.
Analistas dizem que a pressão salarial também vem da disseminação do sucesso econômico no país e da falta de mão de obra nas cidades costeiras, enquanto o índice de nascimentos em declínio reduz o número de jovens que entram na força de trabalho.
Em consequência, dizem economistas, a mão de obra chinesa torna-se cada vez mais ousada.
No ano passado, os trabalhadores fizeram greves periódicas no sul da China -algumas supostamente envolvendo empresas globais. Embora esses atos tenham sido resolvidos pacificamente, as greves recentes nas fábricas da Honda atraíram atenção considerável do público.
A companhia japonesa ofereceu aos trabalhadores aumentos de 24% a 32%, elevando o salário médio mensal para cerca de US$ 300. Mas, poucos dias depois, foi novamente alvo da inquietação trabalhista.
Uma nova passeata, em uma fábrica de escapamentos na cidade de Foshan, obrigou a Honda a parar o trabalho em 1 de suas 4 montadoras na China. Pelo menos dois fornecedores de peças também foram afetados.
Outro grande empregador na China que enfrenta questões trabalhistas, a Foxconn Technology -uma enorme fabricante de produtos eletrônicos que também anunciou aumentos salariais recentemente- disse que está reconsiderando a maneira como dirige suas operações, por causa das críticas a suas práticas no local de trabalho.
A Foxconn, que teve nove suicídios entre trabalhadores em seus enormes campi na metrópole meridional de Shenzhen, disse que poderá entregar a administração de alguns dormitórios de funcionários para governos locais na China.
"Como a Foxconn é uma empresa comercial que opera como sociedade, somos responsáveis por quase tudo sobre nossos trabalhadores, incluindo emprego, alimentação, dormitório e até relacionamentos pessoais", disse Arthur Huang, porta-voz da Foxconn. "Isso é demais para uma única empresa."
Depois dos suicídios, sociólogos pediram o fim do "modelo de desenvolvimento que sacrifica a dignidade humana".
A Foxconn, subsidiária da Hon Hai Precision Industry, de Taiwan, que fabrica equipamentos para empresas como Apple, Dell e Hewlett-Packard, disse que pretendia duplicar os salários de muitos de seus 800 mil trabalhadores na China para cerca de US$ 300 por mês.
A companhia disse que transferirá os custos aos clientes.
Muitas empresas globais -incluindo Daimler-Benz, Ford, Coca-Cola e PepsiCo- têm operações na China que poderiam ser vulneráveis à inquietação trabalhista.
Para as principais exportadoras do Japão, as greves na Honda serviram para deixar claro que as rendas e as expectativas dos chineses aumentam junto com o rápido crescimento do país, enquanto a situação econômica do Japão vacila, e os dois países sofrem um realinhamento que vai modificar a interação de suas economias.


Colaborou com pesquisa Bao Beibei


Texto Anterior: Dinheiro & Negócios
Dívida fantasma de US$ 2,6 tri assusta bancos europeus

Próximo Texto: Incerteza financeira recupera o brilho do ouro como refúgio
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.