São Paulo, segunda-feira, 21 de junho de 2010

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ARTE & ESTILO

Do Canadá, um astro improvável do hip-hop

Por JON CARAMANICA

LOS ANGELES - Durante a maior parte de sua adolescência, o jovem astro do hip-hop Drake, alto, forte e bonito, foi conhecido como Aubrey Graham (Drake é seu nome do meio) e interpretou Jimmy Brooks no popular drama adolescente da TV canadense "Degrassi: The Next Generation".
Nos últimos 18 meses, porém, ele virou a mais importante e criativa nova figura do hip-hop, o que pareceria improvável. Ex-atores infantis judeus-canadenses mestiços não têm um registro de sucesso na indústria do rap americana.
"Thank Me Later", que acaba de ser lançado, consolida o lugar de Drake entre a elite do hip-hop. É um disco emocionalmente articulado e cativante, que mostra a profundidade de Drake como rapper, cantor e compositor, sem sacrificar a acessibilidade.
O fato de ele fazer tudo isso bem o marca como um estudante aplicado nos últimos 15 anos: a atenção para os detalhes de Jay-Z, o dom para a melodia de Kanye West, a malícia pop de Lily Wayne.
"Thank Me Later" tem sua parcela de violência, mas é mais notável pelo lamento e a dor.
Na verdade, escapar à vulnerabilidade tem sido um fato na vida de Drake desde a infância. Seus pais se separaram quando ele tinha três anos. Filho único, viveu com a mãe, que logo começou a lutar contra a artrite reumatoide, condição que a impediu de trabalhar, obrigando Drake a ser responsável muito jovem. Seu pai, que é negro, foi uma presença intermitente -às vezes estava lutando contra as drogas; às vezes, na cadeia.
"Não fui protegido das dores da idade adulta", disse Drake. Quando alguma coisa o aborrecia na adolescência, ele costumava dizer a si mesmo: "Isso é apenas o agora. Eu posso mudá-lo. Posso mudar qualquer coisa".
Desde tenra idade ele se interessou pelas artes, seja reescrevendo as letras de "Mary had a little lamb" ou passando tempo como modelo infantil. Ele e sua mãe viviam então em um bairro judeu abastado de Toronto, onde muitas vezes ele era o único aluno negro na escola. A mãe é branca e judia, e Drake fez o bar mitzvah.
Na escola, teve dificuldades acadêmicas e sociais. "Momentos de construção de personalidade, mas não ótimas lembranças", lembrou. Na oitava série ele arrumou um agente e logo foi mandado para um teste para "Degrassi", uma versão atualizada de um popular drama canadense dos anos 1980.
Drake contou que fez o teste depois das aulas, no mesmo dia em que fumou maconha pela primeira vez. No entanto, conseguiu o papel do rico e apreciado astro do basquete Jimmy Brooks, que foi originalmente concebido como um jogador de futebol branco.
"Parte de sua jornada é tentar descobrir onde ele se encaixa no mundo, tendo uma mãe branca judia e um pai negro muitas vezes ausente", disse Linda Schuyler, criadora do programa. "Jimmy Brooks é quase um fator de alívio. Era a antítese de sua vida nessa época."
Em 2006, Drake, então seguidor da ala boêmia e pensativa do hip-hop, lançou seu primeiro mixtape, "Room for Improvement".
O astro do rap de New Orleans Lily Wayne ouviu a música de Drake em 2008 e o convidou para uma turnê. Drake logo se tornou chave na turnê maluca de Wayne, e sempre que havia um tempo no estúdio ou no quarto de hotel ele trabalhava em suas canções.
O resultado foi "So Far Gone", sua terceira fita e uma das gravações de hip-hop mais bem recebidas do ano passado. É um dos documentos mais melancólicos e ambivalentes de sucesso do rap já lançados, o que é estranho, porque foi gravado muito antes do aparecimento de Drake nos palcos.
O bem-humorado "Best I Ever Had" tornou-se seu hit solo precursor. Chegou ao número 2 na Billboard Hot 100, algo praticamente inédito para uma canção originária de um mixtape. Afinal, conquistou para Drake algumas nomeações para o Grammy, uma estreia para um rapper que ainda não tinha lançado um disco.
"Muito de 'So Far Gone' foram previsões", ele disse. "Eu fazia rap sobre coisas que só estou passando agora." Em consequência, "Thank Me Later" muitas vezes parece uma memória: Drake é um raro artista pop que parece pensar sobre si mesmo no passado. Em "Light Up", ele canta: "Eu continuo pensando: quão jovem se pode morrer de velhice?".
Agora, Drake se pergunta se a verdadeira intimidade está fora de alcance. "Eu sacrifiquei alguma coisa?", perguntou. "[Será que] ainda não percebi o que é porque estou desfrutando muito isto?"


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