São Paulo, segunda-feira, 21 de junho de 2010

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Mundo da arte explora os meios orgânicos

Por NATALIE ANGIER

O termo "orgânico" significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Para um jardineiro, pode ter a ver com o adubo. Para um químico, diz respeito aos compostos de carbono.
Para o artista Fabian Peña, a palavra está ligada às baratas, aquelas criaturas noturnas vistas habitualmente vagando por em bueiros ou ruas. "Já colecionei baratas de muitos lugares diferentes", disse Peña. "De Cuba, México, Miami, Houston, de todo lugar aonde viajo."
Ele mata as baratas com um spray, as atira num jarro e as leva para seu ateliê na Flórida, onde coloca partes dos corpos na sua arte. Ele cola pernas, formando longos cilindros semelhantes às coberturas das larvas. Com precisão médica, ele arranja as asas em imagens de um crânio humano e dos ossos do pé e da mão, tudo conforme as dimensões do seu próprio corpo.
Peña tem um apreço estético pela barata, a forma como ele pode usar os tons diferentes das asas como sua paleta para expressar luz e sombra.
O apreço é também metafórico, por como temos nojo de algo com que temos tanto em comum -por exemplo, o mesmo gosto para comida e a mesma adaptabilidade. "As baratas são uma testemunha das nossas vidas cotidianas", disse Peña.
Ele também gosta desse meio por uma razão pragmática: "É um material que posso achar facilmente", disse, "e é mais barato do que comprar tinta".
Peña é parte do crescente número de artistas que busca o natural, vasculhando o viveiro do mundo e as ciências da vida à procura de materiais, ideias, verdades cósmicas, homilias tragicômicas, um agente pessoal, um jeito de se destacar na multidão.
Laura Splan, artista com formação técnica em flebotomia (sangria venosa), decora papéis de parede com o seu próprio sangue. Quem os vê pela primeira vez tem "um agradável envolvimento visual", disse. Mas, ao ler um cartão que explica como são feitos, a reação costuma ser "mais complicada" -com um misto de repulsa e fascínio, as pessoas se afastam e se aproximam, e dizem coisas como: "Tomara que ela [a autora] não tenha doenças transmissíveis pelo sangue".
Com semelhante regozijo transfigurador, Levi van Veluw, da Holanda, trata a pele do seu rosto e do seu torso como se fosse terra, espalhando nela camadas de musgo, grama, folhas e flores.
Muitos exemplos de uma arte com cheiro de palha e estrume, inequivocamente orgânica, estão numa nova exposição chamada "Dead or Alive" ("Vivo ou morto"), no Museu de Artes e Design de Nova York. O museu recentemente realizou um evento em que cientistas e artistas discutiram o quanto arte e ciência têm em comum, e o quanto são diferentes.
A conclusão: ambas são importantes, difíceis, exigem criatividade e são motivadas pela curiosidade e pelo desejo de resolver problemas; só que os artistas têm liberdade para criar coisas, o que os cientistas não devem fazer. Independentemente do debate, alguns praticantes dessa arte híbrida possuem credenciais científicas e não têm medo de usá-las.
Jennifer Angus, professora de design têxtil na Universidade de Wisconsin, virou entomologista amadora enquanto criava "Victorian Fancy" ("fantasia vitoriana"), uma série de casas de bonecas e instalações. Ela constrói cenas de felicidade perfeita, mas todos os padrões nas paredes, no chão e na mobília são arranjos lindos de insetos, e todos os personagens nas casas de bonecas são insetos. "Quis criar um padrão que sugerisse um espaço doméstico", disse ela, "mas é claro que uma coisa que as pessoas não querem nas suas casas são insetos".
Angus espera vencer a fobia das pessoas e "reabilitar a imagem do inseto", organismos sem os quais nossas lavouras não seriam polinizadas, e nossos detritos não seriam decompostos.


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