São Paulo, segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MODA

Em crise, alta costura coloca os pés no chão

Por CATHY HORYN

O tecido nas mãos de Thakoon Panichgul é excepcional -um jacquard italiano, com fios de oito cores diferentes, e que custa mais de US$ 100 por metro. Um vestido que Panichgul pretende fazer com esse tecido para o seu desfile custará US$ 2.000.
Ele deixa o pano cair. Incomoda a Panichgul que, por mais que amem roupas bonitas, as pessoas não entendam por que elas custam tanto. "Está se tornando uma batalha perdida."
A alta costura está melancólica. Quando mais uma temporada de desfiles termina em Nova York, em meio ao clima mais gélido no varejo em vários anos, muitos acreditam que se trata não só de um momento difícil para a moda, como também de um momento definitivo.
Eis a realidade: cada vez mais gente compra em fornecedores de roupas chiques baratas. Fábricas que ofereciam trabalhos refinados em Itália e Nova York estão fechando porque as empresas se transferem para a China. Os consumidores não veem longevidade nas roupas que compram. "Acho que o verdadeiro negócio dos designers está em apuros, sem dúvida", disse um executivo de compras da loja Macy's, pedindo anonimato.
Com o temor dos consumidores em gastar, as lojas de departamentos reduziram em 30% as encomendas para o outono (no hemisfério Norte). Para a próxima primavera -as coleções que foram apresentadas até 17 de setembro na Semana de Moda de Nova York-, há pouca melhoria à vista.
"Em meus 40 anos de moda, nunca vi as mulheres com medo de comprar -em todos os níveis de preços", disse Vera Wang, que vende vestidos de US$ 1.000 em lojas como a Bergdorf Goodman e também tem uma linha a preços mais baixos na loja de departamentos Kohl's.
Os varejistas têm pressionado estilistas como Wang a reduzir seus preços. Quem entrasse em uma loja vazia nos últimos meses entenderia o porquê. A rede de luxo Neiman Marcus divulgou um prejuízo de US$ 668 milhões no ano. A Saks teve uma queda de 16%. Os criadores da moda de ponta se perguntam até que ponto podem baixar os preços sem diminuir seu prestígio ou comprometer sua criatividade.
Wang contou ter reduzido em 40% os preços para a sua coleção intermediária deste ano, mas algumas lojas lhe disseram que aqueles vestidos de US$ 600 ou US$ 800 eram talvez baratos demais para uma grife com a dela.
Embora muitos consumidores não devam lamentar a desaparição dos vestidos de US$ 2.000 das prateleiras, é a criatividade das coleções das passarelas que inspira os "looks" no mercado de massa e lança tendências que levam compradores às lojas, temporada após temporada, alimentando um vasto segmento da economia.
Nos 40 anos desde que o prêt-à-porter moderno passou a existir na Europa e nos EUA, os estilistas têm desfrutado de enorme respeito e prosperidade. Entretanto, nos últimos anos, perderam parte da credibilidade junto aos consumidores. Suas roupas se tornaram exoticamente caras, ao cortejarem celebridades e criadores de moda rápida.
Outro impacto da recessão é um retorno aos modelos seguros, que venderam bem em temporadas anteriores. O estilista Elie Tahari, cujas grifes faturam cerca de US$ 500 milhões, está focando em estampas de animais, "leggings" e calças finas, vestidas com túnicas.
"A moda tem de ser nova e usável, e é preciso que seja necessária", afirmou. Tahari reduziu seus preços em 30% e fechou uma fábrica na Itália, para transferir a produção para a China.
As casas europeias, com seu "savoir-faire" e bolso cheio -graças às vendas de produtos de couro e perfumes-, podem ter uma vantagem criativa sobre as americanas, o que fará diferença no mercado. As lojas insistem em que as mulheres, embora agora mais cuidadosas na escolha e propensas a misturar estilos, não podem abrir mão da qualidade de repente.
"Ainda há clientes que desejam esse acabamento", disse Ann Stordahl, gerente-geral de comercialização da Neiman's. "Simplesmente elas são em menor número do que eram."
Mas há um paradoxo em tudo isso. Afinal, o que distingue a moda de ponta é um apreço pelas pequenas diferenças: no caimento, no tecido. Essa é a caixa de ferramentas criativa do estilista. Retire uma ferramenta, e ele tem menos com o que fazer seu trabalho.
Joseph Altuzarra, jovem estilista de Nova York, é especializado em vestidos, feitos na França e que custam cerca de US$ 2.000. Recentemente, ele perguntou à fábrica se poderia simplificar o processo de fabricação do laço usado nos vestidos para reduzir os custos. A fábrica se recusou. "Eles disseram que ficariam com vergonha de produzir uma peça de roupa desse jeito", disse Altuzarra.

"Em meus 40 anos de moda, nunca vi as mulheres com medo de comprar -em todos os níveis de preços"
Vera Wang



Texto Anterior: Homem pode ter domesticado cães para comê-los

Próximo Texto: Um acesso sem glamour ao mundo da moda
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.