São Paulo, segunda-feira, 22 de junho de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Maior segurança em Bagdá permite liberdade de estilo pessoal

Colaborou Muhammed al-Obaidi
Por TIMOTHY WILLAMS e ABEER MOHAMMED

BAGDÁ - As jovens de Bagdá reconhecem que há preocupações mais sérias no Iraque do que cabelo, roupas e maquiagem. Mas também dizem que talvez não haja nada tão prazeroso quanto sair de casa usando um vestido bonito, com os cabelos esvoaçantes, comportando-se como se seu país não tivesse sido destroçado pela guerra e dominado pelo conservadorismo religioso durante a maior parte de suas vidas.
"Para as garotas, a vida seria insípida sem a moda elegante", disse Merna Mazin, 20, estudante de engenharia na Universidade de Bagdá. O que Mazin chama de moda elegante não se assemelha muito à alta-costura ou às roupas de verão que expõem o corpo, como no Ocidente, é claro.
Fazia 40 graus em Bagdá há alguns dias, mas Mazin usava um vestido colorido sem mangas sobre uma calça jeans. Uma blusa preta de mangas compridas cobria seus braços.
Mas seu cabelo preto, com sutis reflexos louros, estava à mostra, sem qualquer cobertura -uma grande vitória para Mazin, uma cristã que durante dois anos usou o tradicional lenço de cabeça das mulheres muçulmanas para evitar ser incomodada pelas milícias islâmicas.
Mazin é uma das centenas -talvez milhares- de jovens em Bagdá cuja liberdade para desenvolver um estilo pessoal é sinal de um relaxamento do conservadorismo cultural iraquiano.
Depois da invasão liderada pelos EUA em 2003, as mulheres tiveram suas opções de moda ditadas pelos religiosos durante a oração de sexta-feira e impostas por membros de milícias armadas que ameaçavam, sequestravam e até matavam as que se vestissem de maneira provocativa -o que foi definido durante algum tempo como qualquer mulher que não usasse uma "abaya", manto que esconde completamente a forma do corpo feminino.
As mulheres ameaçadas por usar roupas ocidentais muitas vezes foram obrigadas a deixar seus empregos ou escolas e a ficar em casa, às vezes durante anos. Mas hoje a segurança melhorou em Bagdá, e algumas mulheres começaram a se livrar de suas "abayas" e vestir-se mais como as mulheres que veem nos canais de TV de todo o mundo, via satélite.
A maioria das que forçam os limites são estudantes colegiais, que têm tênues lembranças da moda feminina antes da guerra. Elas ainda representam uma parcela pequena das mulheres iraquianas, que em geral seguem usando as "abayas" pretas.
Sentada em um café de estudantes na Universidade de Bagdá, Mais Mowafaq, 20, usava um lenço de cabeça. Mas o resto de suas roupas, embora conservadoras, poderia tê-la levado à morte alguns anos atrás: saia preta até o tornozelo, blusa preta de mangas compridas e um longo colar prateado sobre a blusa.
"As milícias não queriam corpos femininos à vista porque achavam que poderiam atrair os homens", disse. "Atrair homens é pecado? Merece a morte?" Mowafaq disse que também parou de usar cosméticos, o que muitas jovens iraquianas consideravam uma necessidade mesmo durante o período mais perigoso.
"Toda a minha maquiagem estragou, e minha mãe se recusou a me levar às lojas para comprar mais", ela contou. "Ela me disse: 'Este não é um momento para maquiagem. É um momento de bombas'."
Dua'a Salaam Sabri, 23, e sua irmã, Riam, 16, lembram-se de quando o único perigo real associado a usar as roupas da moda era o flerte agressivo que recebiam de rapazes na rua. Mas, em 2005, dois carros cheios de milicianos passaram quando Riam voltava da escola com seu pai.
Os homens tentaram, sem sucesso, sequestrá-la como castigo por não usar o que eles chamavam de "roupas respeitáveis", ela contou. Na época ela vestia seu uniforme escolar, uma saia longa e camiseta. No dia seguinte, sua mãe comprou às filhas os primeiros lenços de cabeça e "abayas".
Riam abandonou a escola, e as irmãs começaram a ter problemas psicológicos. Recentemente elas começaram a sair de novo, mas em geral na companhia da mãe. E voltaram a seus antigos estilos.
Na Fashion Away, loja de moda feminina, o dono, Hussein Jihad, até há alguns meses só vendia roupas tradicionais. "Nos adaptamos à situação", disse. "Quando a situação estava ruim, oferecemos saias compridas e, quando a situação melhorou, começamos a trazer roupas modernas."


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