São Paulo, segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

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Tendências mundiais

Pressões econômicas freiam faxina verde global

Por ELISABETH ROSENTHAL

Justamente quando o mundo parecia decidido a combater o aquecimento global de forma mais agressiva, a desaceleração econômica e a queda dos preços do carvão e do petróleo estão revertendo os planos para afastar as empresas e os consumidores do combustível fóssil.
Da Itália à China, a ameaça da crise econômica projetou dúvidas sobre os compromissos de conter as emissões de gases do efeito estufa ou de desativar progressivamente indústrias poluidoras.
O presidente eleito dos EUA, Barack Obama, e a União Européia prometeram cumprir os compromissos de conter as emissões de dióxido de carbono e investir em tecnologias verdes, afirmando que a ação do governo pode estimular a economia e criar empregos na produção de energia sustentável.
Mas a vontade política e os fundamentos econômicos para uma estratégia muito mais assertiva parecem menos firmes que algumas semanas atrás.
"Sim, as coisas mudaram", disse Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção sobre Mudança Climática da ONU. "A indústria européia diz que não podemos lidar com a crise financeira e reduzir as emissões ao mesmo tempo. Os chefes de governo têm outras coisas para pensar."
O declínio econômico também poderá complicar o cálculo político de limitar emissões nos países em desenvolvimento, especialmente na China, que superou os EUA como maior produtor de gases do efeito estufa em 2007. Mas o surto da indústria pesada nesse país, que produziu um forte aumento de suas emissões, já deu sinais de desaceleração. Especialistas afirmam que as emissões na China -e a necessidade premente de limitá-las- poderão recuar até que as condições econômicas melhorem.
De Boer continua otimista de que as grandes potências manterão suas promessas de reduzir as emissões: "Não acho que alguém vai ser idiota de se concentrar no curto prazo e ignorar a questão em longo prazo, porque essas decisões estarão conosco por 30 anos".
Mesmo assim, há sinais de considerável revisão dos compromissos, pelo menos de curto prazo, para investir em tecnologia verde e energia alternativa. A ministra da Economia da Itália, Stefania Prestigiacomo, disse no mês passado que há necessidade de "mudanças profundas" no pacote climático da UE por causa da crise econômica global. Economias baseadas no carvão, como a da Polônia, têm preocupações semelhantes.
Barbara Helfferich, porta-voz da Comissão Européia para o Meio Ambiente, disse: "Investir na redução de emissões é mais difícil em tempos de recessão do que quando se tem dinheiro para gastar".
A Comissão Européia diz que está planejando manter o rumo para reduzir as emissões em 20% até 2020- e ao fazê-lo espera ter vantagens em termos de geração de empregos, fontes renováveis e inovação energética quando a economia global se recuperar. "Sei que parece contra-intuitivo, mas o momento de desaceleração é exato para atacar a transição de uma economia de alto consumo de carbono para uma de baixo consumo", disse Helfferich.
Mas o atual declínio econômico talvez tenha sérias conseqüências ambientais em longo prazo, porque pode reduzir o investimento em tecnologias mais verdes sem mudar fundamentalmente o quadro das emissões em longo prazo. Com tantos projetos de energia renovável e programas em fases iniciais, seu sucesso é facilmente minado pela falta de crédito. A construção de geradores a vento custa mais de US$ 2,5 bilhões por gigawatt, comparados com US$ 600 milhões para o gás. Os subsídios de carbono podem estreitar essa diferença, mas com os atuais preços baixos é mais barato queimar carvão, mesmo depois de pagar as multas por emissões de dióxido de carbono.
A ONU diz que 40% da capacidade geradora de energia do mundo têm de ser substituída nos próximos 5 a 10 anos. Seis meses atrás, os altos preços do petróleo, o crédito fácil e a pressão política levaram muitos governos a promover biocombustíveis, fazendas eólicas e projetos nucleares e a extinguir usinas de combustível fóssil. Mas a lógica mudou.
"Se por causa do atual cenário econômico você escolher o barato e sujo, estaremos em grandes dificuldades", disse De Boer.
A UE estima que reduzir as emissões custará à indústria italiana 13 bilhões de euros (R$ 42,7 bilhões).
A Itália calcula o custo em 27 bilhões de euros e diz que não pode pagar. "Transições são caras", disse Helfferich. "Mas esta dificuldade de curto prazo criará novos setores, que geram empregos e combatem a mudança climática."


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