São Paulo, segunda-feira, 25 de outubro de 2010

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Patriarca dos calçados se aferra à tradição

Por LIZ ALDERMAN
SANT'ELPIDIO A MARE, Itália - Diego Della Valle, presidente da fábrica de calçados finos Tod's, faz as coisas à moda antiga: por instinto. Para descobrir se um novo estilo de sapatos funcionará no mercado, ele os calça.
Apesar de gerir a Tod's como um tradicional negócio familiar do Velho Mundo, Della Valle a transformou numa companhia multinacional e multibilionária, cujos mocassins de couro macio são usados por gente como a princesa Stéphanie, de Mônaco, e Gwyneth Paltrow. Hillary Clinton exibia uma bolsa Tod's no seu primeiro dia como primeira-dama, e Tom Hanks aparece calçando Tod's em "O Código da Vinci".
O segredo é puro estilo italiano, o qual Della Valle diz ser identificável em qualquer lugar do mundo.
"Quando estou caminhando no Central Park [Nova York], reconheço os italianos", diz ele. "Porque um italiano, mesmo quando corre, está perfeitamente vestido."
No seu amplo escritório branco, numa sede projetada por sua esposa arquiteta, não há computadores nem iPhones. Acima dele paira uma silhueta pintada do presidente John Kennedy, um dos seus ídolos.
Seu pai, Dorino, 85, cujo negócio de sapatos feitos à mão foi transformado por Della Valle num império familiar, ainda aparece por lá todo dia. O irmão mais novo de Della Valle, Andrea, é gerente de operações; ele é também sócio da Fiorentina, time de futebol que a Tod's comprou em 2002.
A tradição é o que mantém a empresa em crescimento. "Não assumimos riscos", diz Della Valle, que se recusa a transferir a produção para locais mais baratos, como a China (embora a Tod's tenha 24 lojas lá).
Um mocassim masculino de couro de crocodilo, que é vendido por € 3.500 (cerca de US$ 4.850), custa € 1.590 para ser produzido na Itália. Fazê-lo na China reduziria o preço à metade. Mas Della Valle desdenha das empresas que mandam a fabricação para o exterior.
A Tod's precisa defender sua margem de lucro, transferindo aos consumidores os custos da costura manual, do couro de qualidade e da contínua inovação, o que só é possível promovendo a exclusividade.
A empresa "certamente está abrindo mão de alguma lucratividade por não gastar menos na fabricação", disse Davide Vimercati, analista da UniCredit em Milão.
Mesmo assim, a Tod's aumentou seu faturamento durante a crise financeira, e seu lucro cresceu de € 77 milhões em 2007 para € 86 milhões no ano passado (desde 2009, Della Valle acumulou uma participação de 9% na Saks Inc., o que o torna o segundo maior acionista, atrás do bilionário mexicano Carlos Slim. Todo o investimento saiu do seu bolso).
A empresa construiu discretamente a sua reputação com a fabricação de sutis variações do modelo "gommini", um mocassim originalmente para motoristas.
Comandar a empresa, diz Della Valle, é como uma obsessão desde que ele largou a faculdade de direito. Mas ser tão focado pode virar um castigo, dizem analistas.
A chave para empresas como a Tod's é ter um patriarca que projete os valores familiares para o produto, afirma Stefania Saviolo, diretora do MBA de moda da Universidade Bocconi, em Milão.
Para Vimercati, Della Valle deveria preparar a Tod's para fazer "uma transição de uma empresa de estilo empreendedor para uma empresa com gestão profissional". Isso funcionou para companhias como a Luxottica, fabricante italiana de óculos, mas foi mais complicado para a Benetton. Aquele negócio familiar também contratou gente de fora, mas a família continua envolvida, o que semeia certa confusão a respeito da cadeia de comando, segundo Vimercati.
Della Valle admite ter "muita sorte, porque faço o que gosto -eu guio minha vida".
Talvez pensando na sua origem humilde, ele estende o braço na direção da imagem de Kennedy. "Ele foi um homem que contribuiu com a imaginação da jovem geração e dos pobres da época", disse Della Valle.
Sua prosperidade contrasta com a pobreza da família no passado. Sua mãe, operária num curtume, costumava pedir comida ao cozinheiro da mansão condal que ele hoje possui -além de ter outras cinco casas, duas Ferraris e um helicóptero.
Della Valle para diante de uma velha mesa de madeira onde seu avô e seu pai costumavam costurar sapatos manualmente. "Está aí", diz, "para não esquecermos nossas raízes".


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